TERRAS DE PENAGOYÃ:

Apesar de nos tempos de hoje não ser uma realidade correspondente ao que era no passado, defendo a sua promoção e estudo. Porque a nossa história deve ser estudada, preservada e publicitada.
SE NÃO DEFENDERMOS O QUE É NOSSO, QUEM É QUE O DEFENDE?
"

Por Monteiro de Queiroz, 2018

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The history of Santa Marta de Penaguião

History

The history of Santa Marta de Penaguião is affirmed by vestiges of the castros that have been discovered in Fontes, Lobrigos, Cumieira, Louredo and Medrões, which were settled prior to the establishment of the Kingdom of Portugal.[3] Some of the toponymy in the region also presupposes the existences of tribal clans in this Douro valley region.[3]

The municipality of Santa Marta de Penaguião were part of the Terras de Penaguião, an administrative division that existed during early Middle Ages (9th-10th century) that extended between the Douro and Corgo watersheds, including the Serra do Marão and the Terras de Panóias (today Vila Real).[3] Comprehensively, this included the current municipality, in addition to portions of the municipalities of Peso da Régua and Vila Real.[3]

During the reign of Afonso Henriques the region was governed by Moço Viegas, son of Egas Moniz.[3]

King Sancho I issued a charter (Portuguese: foral) in 1202, and King Manual I re-issued a new foral on 15 December 1519.[3][4] The forals provided detailed explanations of the rights, privileges and responsibilities of the local landowners, covered within the limits of the municipality.[3]

During the 17th-18th century there was a marked increase in the homes, estates, churches and patrimony constructed in the municipality, while documents refer to expensive land rents obtained by seigneurial landowners.[3] This was primarily due to export of wine and the cultivation of vineyards, which occupied a great part of the terraced landholdings of the local gentlemen. This success also brought a lot of opportunism, the mixing of castes, and later, the collapse of wine sales, as the quality deteriorated. In order to overcome these problems, and in order to rejuvenate exports, (through the influence of the friar João de Mansilha and the Marquess of Pombal), King Joseph signed into existence (10 September 1756) the Companhia Geral de Agricultura das Vinhas do Alto Douro.[3] This company improved the production of wine sales in the Douro valley, establishing a Demarcated Export product with specific quality expectations: wines that could not meet these levels of quality could not be sold as "Douro Wines". The Companhia Geral was also responsible for affixing similar demarcation to the Porto Wine, before any non-Douro brands began appearing in Europe.[3]

In the 19th century, through the administrative reforms, and owing to the regions importance to the Demarcated Region of the Douro, Santa Marta retained its municipal status.[3]

in https://ipfs.io/ipfs/QmXoypizjW3WknFiJnKLwHCnL72vedxjQkDDP1mXWo6uco/wiki/Santa_Marta_de_Penagui%C3%A3o.html#cite_ref-CMHistoria_3-10, [Consulta em 13dez2017]

Freguesias

Freguesias

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015
Porquê as freguesias?


Linhas gerais de um estudo sobre as origens das pequenas autarquias*


  Desde a primeira metade do século XIX, se vem sublinhando, cada vez mais, a importância das autarquias, na vida e na governação dos povos. Esse reconhecimento tem acompanhado o aprofundamento da vivência democrática que caracteriza as sociedades modernas, mas tem as suas raízes profundas em instituições que floresceram ao longo dos séculos. Com ele está relacionado o desenvolvimento dos estudos históricos que têm por objecto as origens das instituições autárquicas e a pluralidade dos contributos que nelas convergiram, dos quais resultou a fisionomia de que se revestiram nos tempos mais recentes.

[Introdução]

1. Ao analisar a história das autarquias, os estudiosos têm-se concentrado na história dos municípios, entendendo estes num sentido praticamente unívoco, em resultado da configuração com que ficaram após a reforma administrativa levada a cabo no século XIX, e deixando de lado, como manifestações episódicas, alguns dos mais antigos municípios que, por razões diversas – especialmente políticas e económicas – não sobreviveram como tais à reforma administrativa.
Por outro lado, encarando a história das autarquias como a história dos municípios, esqueceu-se a história das freguesias e das aldeias, como um capítulo secundário, porventura despiciendo, da nossa história como povo, cimentada na existência de muitas e plurifacetadas comunidades.
Para tal situação contribuíram as circunstâncias em que surgiram as freguesias com o estatuto de que desfrutam na actualidade, o que levou a supô-las como uma inovação, introduzida para substituir uma realidade anterior, as paróquias religiosas, quando se achou necessário implementar a separação de poderes, entre o Estado e a Igreja, entre a prática religiosa e a vida civil[1].
Na verdade, a freguesia já existia, ainda que, por então, nela se fundissem os dois aspectos, o civil e o religioso, e desta fusão resultasse que, no correr dos tempos, devido à importância de que desfrutava na sociedade civil, o poder religioso se impusesse como poder dominante, dentro da freguesia ou paróquia.
Não restam dúvidas de que, desde longe, a freguesia teve uma indiscutível função civil, como resulta daqueles momentos em que os seus habitantes se viram na necessidade de se unir para defender os seus próprios direitos ou para realizar obras importantes de interesse colectivo.
Outra das razões que fizeram com que se relegassem as freguesias para o segundo plano foi a convicção de que elas eram entidades menores, com uma importância muito reduzida na organização do território. Este preconceito, não apenas subalternizador mas ainda minimizador do papel das freguesias, acentuou-se pelo facto de a reforma que levou à separação entre a paróquia religiosa e a sociedade civil se ter operado numa época em que os espíritos estavam sob a influência da concepção centralista da ideologia napoleónica.
Mais do que como realidades próprias, com a sua individualidade e a sua história, as freguesias foram e continuam a ser vistas como simples parcelas em que foram divididos os municípios, por razões de prática administrativa, como se não tivesse acontecido exactamente o contrário, isto é, como se geralmente os municípios não tivessem resultado da reunião de um conjunto de freguesias, na sua maioria preexistentes.
O preconceito de que, como realidade civil, não existia a freguesia, mas apenas a paróquia religiosa, contribuiu para que os historiadores do municipalismo e das instituições democráticas se não interessassem pela história das freguesias. Parecia mesmo que até um certo momento só existia a paróquia ou que a freguesia não tinha outras funções além das religiosas. Só a partir de uma dada altura, como realidade nova, teria nascido a freguesia civil!
Por esse motivo é que a história das nossas comunidades, na perspectiva civil, se tem cingido à história dos municípios. Nessa linha, entre nós, se enquadram os estudos de Alexandre Herculano, Teófilo Braga, Henrique da Gama Barros, Torquato Soares, e recentemente de outros[2].
Essa orientação teve, porém, como contrapartida o estudo da história das paróquias, como entidades de cariz religioso, no âmbito da história da Igreja. Paralelamente ao que sucedeu com a história dos municípios – em que especialmente se fez sentir a influência de Augustin Thierry – foi Imbart de la Tour, autor do livro Les Paroisses Rurales du IV.e au XI.e  siècle, o primeiro historiador que chamou a atenção para a importância do estudo das paróquias[3].
Desde então, com especial relevo para as últimas décadas, têm-se multiplicado os trabalhos dedicados à história das paróquias nos vários países, focando aspectos tão diversificados como o povoamento e a organização territorial, a difusão do cristianismo e a organização eclesiástica. Em Portugal, para além das investigações dedicadas a temas parcelares, a história das freguesias do ponto de vista religioso serviu de tema à valiosa monografia As Paróquias Rurais Portuguesas, escrita por Mons. Miguel de Oliveira[4].
Alberto Sampaio, autor de As Vilas do Norte de Portugal, foi o primeiro historiador português que orientou a sua investigação no sentido de definir o papel que entidades tão secundárias como as villas romanas desempenharam, como antepassados de muitas das freguesias que actualmente matizam o nosso território[5]. Embora ainda longe de alcançarem o incremento de que beneficiam actualmente, o limitado avanço dos estudos históricos e arqueológicos da sua época, não lhe permitiu avaliar o papel de outras formas de organização comunitária, pelo menos desde o período romano, na formação das paróquias e freguesias.

[Comunidades primitivas e ocupação romana]

2. Ainda antes da ocupação romana, já as comunidades locais se tinham instalado em territórios, mais ou menos definidos, e exerciam neles a sua actividade. No entanto, apesar do esforço dispendido pelos arqueólogos, ainda não temos um conhecimento satisfatório dessas comunidades, pela carência de elementos documentais. As escassas informações de que dispomos a esse nível devem-se a autores do período romano, mencionando-se como os mais antigos Estrabão, Pompónio Mela e Plínio. Com base nas informações hauridas nestes escritores, os arqueólogos do século XX procuraram interpretar um dos signos que aparece em algumas inscrições do noroeste peninsular, uma espécie de C voltado para a esquerda [ɔ], que tanto poderá corresponder a centúria, segundo alguns, como a castellum, segundo outros, mas de qualquer modo designará uma comunidade étnica ou o espaço fortificado onde a mesma se refugiava.
À medida que se estende e aperfeiçoa a estrutura administrativa implementada pelos romanos, torna-se possível um conhecimento mais aprofundado das sociedades espalhadas pelo território. Esse conhecimento continua naturalmente a ser condicionado pela existência de fontes escritas, de índole narrativa, jurídica ou epigráfica, e pelos dados que essas fontes disponibilizam. A natureza e organização dessas comunidades espelham o que se passava nos arredores de Roma, no Lácio, e depois em toda a Itália, que a seguir se reproduziu nas Gálias e na Península Ibérica.
A organização administrativa romana, que inicialmente visava objectivos de estratégia militar e de manutenção da ordem pública, e logo a seguir o domínio do território destinado a controlar os recursos materiais e a tornar efectivas as exacções fiscais, importantes para o funcionamento da máquina do império, baseava-se efectivamente na divisão em províncias (na Hispânia, a partir de 127 a.C., a Ulterior e a Citerior e, com Augusto, depois de 27 a.C., a Lusitânia, a Bética e a Tarraconense), governadas por um pretor, propretor ou cônsul, e, depois, na divisão destas em conventi, cuja existência se relacionava com a administração da justiça, mas, na prática, a governação do território era feita a partir das cidades, algumas preexistentes e outras fundadas sob o domínio romano[6].
As cidades do Império Romano, em resultado da sua origem e do modo de integração no domínio de Roma, gozavam perante a administração de tratamentos diferenciados, que se reflectiam no estatuto fiscal e na autonomia interna de que gozavam – peregrine, foederate, stipendiarie, libere et imunes…
Para além de fundarem colónias – cidades fundadas ex novo, com cidadãos enviados por Roma, geralmente veteranos do exército e suas famílias – as autoridades romanas elevaram à categoria de municípios vários núcleos urbanos anteriores à sua chegada. Esta promoção dava-lhes o privilégio de serem tratados como parceiros pelas autoridades romanas e de se governarem com autonomia. Aos respectivos habitantes eram concedidos todos os privilégios de que usufruíam os habitantes de Roma.
O conjunto dos habitantes, designado como populus ou plebs, ou com outros nomes, elegia, segundo normas precisas, os magistrados que se ocupavam do governo da cidade – os questores (que tratavam dos recursos financeiros), os edis (que tinham a responsabilidades das estruturas materiais) e os duúnviros (a que competia a administração da justiça).
A existência de um considerável número de municípios na área geográfica correspondente ao hodierno Portugal está em relação com o elevado nível de municipalização alcançado por este território durante a ocupação romana.

[As comunidades do mundo rural]

3. Para lá das muralhas das cidades, estendiam-se grandes espaços, com uma população mais ou menos densa, que deles extraía os recursos necessários à respectiva sobrevivência, cujos excedentes eram canalizados para o abastecimento dos centros urbanos. Esta população distribuía-se pelos diversos pagi e vici disseminados pelo território.
Um pagus era uma área rural, de povoação relativamente dispersa, cujos habitantes geralmente se designavam como pagani. Observe-se que o significado adquirido por este termo (pagão, e, dele derivado, paganismo) foi responsável por algumas confusões de linguagem, actualmente superadas. O pagus abrangia um território relativamente vasto, dentro do qual se localizavam as explorações agrícolas – os fundi. Os pagi oram tratados como unidades censitárias e fiscais pela administração romana, mas a sua existência era possivelmente anterior e os seus habitantes ou os que os representavam agiam com autonomia, e eram tratados como parceiros, pelo menos em relação a certas matérias, como a chamada lustratio finium ou reconhecimento dos limites (que se consideravam sagrados) do pagus, a gestão dos edifícios, das obras públicas ou de fruição pública, como as viae vicinales, e dos dinheiros resultantes das doações particulares. A lustratio pagi e outras funções de índole predominantemente religiosa, como o culto das divindades locais e o culto do imperador, eram exercidas pelos magistri pagi, mas pelo menos numa parte desses pagi havia um conselho de decuriões, que tomava as decisões de interesse colectivo ex scitu pagi.
O vicus (de que, aliás, também derivam as palavras vizinho, vizinhança, e até o topónimo Vigo) correspondia a um núcleo habitacional de pequena dimensão. Os vici devem a origem a factores de ordem económica – agrícola, artesanal e comercial – ou religiosa. No vicus de índole agrícola, os moradores ou vicini ocupavam-se fundamentalmente do cultivo da terra, frequentemente através da sua exploração comunitária; um conselho de moradores deliberava sobre matérias idênticas às que na cidade eram da competência da Ordo decurionum, como, por exemplo, da cedência de terreno para a erecção de um monumento honorífico. Havia excepções, como aquela em que um vicus estava na dependência de um patrono, tendo sido ou não por este fundado. Os vici ligados às actividades artesanais ou comerciais correspondiam a importantes áreas de produção de artefactos, e situavam-se nos lugares de paragem (stationes) ou nos cruzamentos das vias de comunicação e portos, assim como em locais onde se realizavam feiras e mercados. Alguns nasceram por mercê de factores religiosos, na proximidade de santuários, especialmente daqueles que atraíam as pessoas por razões de saúde, designadamente quando estavam associados às águas termais.
Testemunhos epigráficos mostram-nos que pelo menos alguns vici eram governados por magistri eleitos anualmente e tinham conselhos formados por indivíduos que prestavam assistência aos magistrados iurisdiscendi quinquenales, que se ocupavam dos problemas da justiça, deliberando vici sententia, e eram responsáveis pelas operações de censo, que se repetiam de cinco em cinco anos, seguindo o exemplo do que se passava nas colónias e municípios. Torna-se clara a função administrativa que, tal como o pagus, também o vicus desempenhava. O vicus estava, no entanto, longe de se apresentar como uma realidade homogénea, em todos os casos, e variava entre o pequeno centro habitacional em desenvolvimento mas já próximo dos modelos urbanos, e o pequeno aldeamento rural, onde se registavam situações económicas e sociais diversificadas, em certos casos de grande pobreza.
Em simultâneo com os pagi e vici, devemos considerar outras realidades, como os domínios particulares, entre os quais se destacam as villae. Embora em muitos casos relacionadas com a administração fiscal, estas villae ou “vilas” eram explorações agrárias privadas, de razoável dimensão, que, além das terras de cultivo e dos montados, incluíam as habitações do senhorio ou do feitor e as dos trabalhadores, os celeiros, os lagares, as oficinas, quando fosse o caso, e os estábulos. Com o andar do tempo, ao longo da Idade Média, os trabalhadores destas villas alcançariam diversificados níveis de autonomia, em razão dos quais as mesmas se apresentam, na perspectiva das freguesias posteriores, em plano idêntico ao dos pagi e vici. Todos estes vocábulos continuarão a aparecer, nos tempos medievais, a designar as realidades sobre que em grande parte assentam as paróquias e as freguesias dos séculos posteriores.

[Após o advento do cristianismo]

4. Quando falamos em paróquias, estamos a mencionar uma realidade que supõe a grande mudança que entretanto se deu no Orbe romano e resultou da difusão do cristianismo e da sua transformação em religião do Estado, com o imperador Constantino (306-337). A Igreja como instituição assentará os pilares nas estruturas do Império, servindo-se até do seu vocabulário, como sucedeu, por exemplo, com a palavra diocese, introduzida pela reforma de Diocleciano, para designar a capital de uma grande área administrativa, que englobava um conjunto de províncias, embora só muito mais tarde, e com outros cambiantes, venha a ter uma utilização eclesiástica[7].
A Igreja estabelecerá também as bases da sua organização a partir das grandes cidades, onde residia o Bispo, e os cristãos que nela viviam, e depois os do mundo rural que a circundava, se reuniam, recebiam o baptismo, participavam na celebração da Eucaristia e eram sepultados.
À medida que o cristianismo se difundia até ao mais longínquo aro rural, tornava-se cada vez mais necessário criar meios de assistência à população, através da erecção de lugares destinados a acolher as assembleias dos crentes, as igrejas, aonde o Bispo ou os clérigos por ele delegados se deslocavam, para ministrar a catequese e presidir às celebrações dominicais, uma vez que inicialmente o baptistério e o cemitério continuavam a localizar-se na sede episcopal. Estas novas igrejas eram construídas nos pagi e vici, por onde estavam disseminados os cristãos que se iam convertendo, e por vezes ocupavam os lugares anteriormente dedicados aos ídolos venerados pelos seus habitantes. Encontramos menção de um movimento de erecção de igrejas relativamente intenso na História dos Francos, de Gregórios de Tours (539-594). Este movimento era comum a outras áreas da cristandade, incluindo o noroeste peninsular.
Em pleno reino suevo, foram elaborados, na sua forma inicial, dois importantes documentos, posteriormente conhecidos como Divisio Theodomiri e Divisio Wambae. A Divisio Theodomiri (Teodomiro foi o rei que conduziu os suevos ao cristianismo), documento que pretensamente teria sido elaborado num Concílio realizado em Lugo, em 569, fornece-nos a lista das paróquias então existentes no espaço correspondente ao reino suevo, independentemente da designação com que genericamente são referidas (abstemo-nos por agora de estudar os matizes dos vocábulos diocese e paróquia em relação a esta e às épocas seguintes). As “ecclesiae” aí mencionadas correspondem a antigos vici (nome, todavia, não usado no documento), mas em simultâneo faz-se o elenco de uma série de pagi (estes assim referidos), a que se estendem igualmente os cuidados pastorais de cada um dos Bispos.
Os suevos acabaram por ser integrados no reino visigodo. Ora os visigodos, por razões históricas suficientemente conhecidas, foram de todos os bárbaros os mais próximos herdeiros da tradição romana. S. Isidoro de Sevilha (560-605), que personaliza e compendia todo o saber do seu tempo, na conhecida obra Etimologias, classifica as povoações existentes na época, distribuindo-as pelas categorias já conhecidas: as cidades (dentro das quais, com evidente arcaísmo, distingue os municípios e as colónias), os vici, os pagi e os castella, entendidos no sentido que temos vindo a referir.


[Comunidades locais sob a administração muçulmana]

5. Poder-se-ia recear que durante a ocupação muçulmana, pelo menos na metade sul da Península Ibérica, a situação se tivesse alterado. Mas na verdade, embora com o uso de nomes diferentes, tomados da língua árabe ou dos seus dialectos, encontramos nas terras meridionais um panorama semelhante ao do norte.
Assim, deparamos com áreas mais vastas, à espécie de distritos, divididas em cora’s, que, por sua vez se subdividem em demarcações menores, chamadas iqlim, dentro das quais se localizavam as várias alquerias ou aldeias. Note-se que o vocábulo al-deia, que então designa um pequeno conjunto de casas, normalmente o edifício destinado à habitação e os seus anexos, só mais tarde – e curiosamente fora do território sob o domínio muçulmano – virá a adquirir o significado com que hoje o utilizamos: encontra-se pela primeira vez em 1253, numa carta régia endereçada aos “hominis de aldeis et de terminis de Bragancia de extra villam de Bragancia”[8].
Se é geralmente admitido que entre os muçulmanos não existiu qualquer instituição que se pudesse comparar aos municípios da Europa ocidental e, em concreto, da Península Ibérica, o mesmo não poderá dizer-se com rigor a propósito das mais pequenas comunidades, especialmente das que se localizavam no mundo rural. Um certo abandono dessas comunidades a si mesmas, por parte do poder central, desde que satisfizessem os encargos tributários, levou-as a organizarem-se localmente, em moldes que se poderão considerar autogestionários. Documentos do século XII e XIII, testemunham a sobrevivência de algumas dessas comunidades rurais ou djama’s (aljamas na versão fonética dos reinos cristãos), que eram dirigidas por conselhos de anciãos ou shuyûkh. Encontramos influências dessa instituição nos conselhos de notáveis designados como “dos seis” nos forais extensos da área de Ribacôa.

[Últimos séculos do primeiro milénio]

6. No mundo cristão ocidental, o número de paróquias cresceu exponencialmente durante os séculos IX e X. Tal expansão foi acompanhada pelo fenómeno que se designa como a territorialização das paróquias. Operou-se mais rapidamente nas áreas onde houve maior continuidade dos grupos humanos que habitavam no território, e onde, por conseguinte, se tinham preservado melhor as estruturas antigas. Naturalmente, além da preocupação em clarificar a pertença das populações de uma determinada área a uma igreja específica, para efeitos de baptismo, de sepultura e de outras implicações religiosas, havia, como nos antigos vici e pagi, uma nítida motivação que podemos dizer de índole fiscal, isto é, a preocupação de delimitar as áreas geográficas para efeitos de pagamento da dízima e de outros contributos. Essa territorialização virá a ser reconhecida oficial e definitivamente pelo Direito Canónico, como consta da Summa Aurea de Henrique de Susa, escrita por volta de 1250[9].
Um dos melhores testemunhos do caminho já percorrido no âmbito da organização paroquial, no século XI, é o Censual do Bispo D. Pedro, que permite elaborar um mapa completo das paróquias da Arquidiocese de Braga no tempo deste dinâmico prelado (1070-1091), fornecendo-nos um panorama muito próximo do actual[10].
Facto é que, para além da realidade religiosa, essas comunidades realizavam assembleias destinadas a tratar dos problemas materiais da vida quotidiana, como as águas, as pastagens, as fontes e os caminhos, e a eleger os mordomos ou os seus sucedâneos, que se encarregavam da colecta dos impostos a pagar ao monarca ou a quem fazia as suas vezes.


[Após a fundação de Portugal]

7. Os séculos XII e XIII, em Portugal, correspondem ao período áureo de expansão das instituições municipais. As comunidades locais foram chamadas a participar na defesa e na consolidação do país e no seu desenvolvimento, e deram-lhe um amplo contributo.
Os forais eram os principais documentos através dos quais se reconhecia a existência de uma comunidade, se delimitava o seu território, e se lhe concedia um determinado grau de autonomia, definindo as regras a seguir, em geral, ou individualmente, nas relações dos vizinhos, quer entre si, quer com os moradores dos territórios circundantes, e com o monarca.
Nos mais antigos desses documentos, não se observa uma distinção clara entre as simples comunidades de freguesia ou de aldeia e os municípios, porque tal distinção só gradualmente se foi introduzindo. Com efeito, nos tempos iniciais, as povoações a que é outorgada uma “carta de foro”, quer tivessem já um certo cariz urbano, como os burgos e póvoas, quer se ficassem pela matriz rural, eram caracterizadas pelo diminuto alfoz territorial.
Só quando, em face das condições geográficas e sociais, uma parte dessas comunidades foi chamada a assumir a responsabilidade de um território mais vasto, arcando com os encargos da administração, da justiça e da defesa, se introduziu a diferenciação, que levou à criação de amplas circunscrições, cuja sede passava a ser a vila. As pequenas autarquias que não beneficiaram deste processo nem foram integradas num município maior mantiveram-se, embora como simples freguesias ou aldeias, com órgãos de governo próprios, porventura mais reduzidos, distinguindo-se então os concelhos de município e os concelhos de aldeia.
As Inquirições levadas a cabo nos reinados de D. Afonso II e D. Afonso III permitem a elaboração de um mapa, que não difere muito do actual, da freguesias do norte do país. Aparecem-nos estas como unidades espaciais, para efeitos de ordem fiscal, e em muitas pagam-se impostos ou tributos de índole colectiva, sendo os moradores responsáveis pela sua recolha, o que os fazia aproximarem-se uns dos outros e aprofundar a consciência da sua existência como comunidade.
Mantinha-se este panorama no começo do século XVI, conforme o testemunho de muitos dos forais manuelinos. A freguesia-paróquia continuará a desempenhar, durante vários séculos, as suas funções simultaneamente nas esferas religiosa e civil, e a servir de intermediária entre os poderes mais altos – a coroa e o município – e as populações.

[Em conclusão: as freguesias no mundo contemporâneo]

8. A primeira reforma administrativa posta em execução após a implantação do liberalismo (Decreto de 18 de Julho de 1835), com o objectivo de adaptar o sistema administrativo às exigências dos tempos modernos, criou as Juntas de Paróquia, que se ocupavam dos assuntos da administração civil, embora a autoridade religiosa – o pároco, que presidia à Junta – continuasse a ter um papel predominante.
Após a implantação da República, ocorrida em 5 de Outubro de 1910, consumou-se a separação entre a paróquia religiosa e a freguesia civil, no meio de um processo nem sempre linear, através do qual se chegou a uma situação que, no fundo, se mantém, na actualidade.
É, porém, de observar que as reformas introduzidas após a revolução liberal enfermavam do pressuposto vicioso do centralismo, de tradição napoleónica, que fazia com que os municípios, à partida credores de uma autonomia que era necessário fomentar, proteger e regulamentar, se tornassem órgãos de execução das políticas do governo central, e, em paralelo, as freguesias se transformassem em instâncias destinadas a concretizar as decisões dos órgãos deliberativos dos municípios.
Deverá acautelar-se a autonomia de uns e de outros, uma autonomia cujas regras têm de ser claras e bem definidas. O mais importante princípio a ter em conta é o princípio da subsidiariedade, mas nem esse está claramente definido ou reconhecido pela legislação, nem é correctamente entendido[11].
No meio de todas as dificuldades que as afectam no presente, é de sublinhar a importância das freguesias, como espaço de construção, definição e preservação de identidades, condição basilar de um desenvolvimento harmonioso.
Podemos aplicar às freguesias o que em relação ao município escreveu Alexandre Herculano, num artigo publicado em O Português, de 17 de Maio de 1853: ”A administração da localidade pela localidade deve chegar até ao último limite em que não repugna ao direito das outras localidades constituídas uniformemente. A administração central abrange tudo o que fica além desses limites no regime prático da sociedade”.
A sobrevivência e o desenvolvimento das comunidades locais constitui os pilares da verdadeira democracia, e a freguesia é o primeiro órgão de que dispõe o cidadão para participar na vida pública e zelar desse modo pelos interesses da comunidade a que pertence.
António Matos Reis

[1] A palavra paróquia é de origem grega (παροίκία), encontrando-se já na versão bíblica dos Setenta, com o significado de “comunidade que vive em terra estrangeira” ou “em peregrinação”, e usa-se em grego moderno com o mesmo sentido que lhe é dado nos países latinos. A palavra freguesia foi introduzida, no latim medieval, para designar a comunidade dos “filii ecclesiae” (filhos da igreja), expressão de que resultaram os vocábulos freguês e freguesia. Tanto paróquia como freguesia são, por conseguinte, vocábulos de origem eclesiástica, e, na actual linguagem da Igreja, usam-se quase indistintamente para designar a mesma realidade. Quando se passa à administração civil, o único vocábulo usado para designar as pequenas autarquias é o de freguesia.
[2] Citem-se especialmente José Mattoso, Humberto Baquero Moreno e Mara Helena da Cruz Coelho.
[3] Imbart de la Tour, Les Paroisses Rurales du IV.e au XI.e  siècle, Paris, Alfonse Picard, 1900.
[4] Miguel de Oliveira, As Paróquias Rurais Portuguesas, Lisboa, União Gráfica, 1950.
[5] Alberto Sampaio, Estudos Históricos e Económicos, vol. I, Lisboa, Liv. Cherdron, 1923, p. 3-254; 2.ª edição, autónoma: As Vilas do Norte de Portugal, Porto, Editorial Vega, 1979.
[6] Para esclarecer um problema de vocabulário, que pode ser suscitado entre o público leigo a estas matérias, observe-se que, entre os romanos, o vocábulo civitas – no plural, civitates – de que deriva a nossa palavra cidade, não se emprega para designar esta mas sim uma comunidade étnica distribuída por um território mais ou menos vasto. A cidade, como hoje a entendemos, é designada pelo vocábulo “urbs”, de onde vem o adjectivo urbano, urbanismo, etc. Quando, neste estudo, nos referirmos à cidade, entenderemos o vocábulo no sentido moderno, equivalente ao romano “urbs”; usaremos o vocábulo “civitas”, na sua forma latina, quando nos referirmos à realidade étnica assim designada pelos romanos.
[7] Inicialmente, ou seja, na sequência da reforma de Diocleciano (284-305), tratava-se de uma grande circunscrição civil, sob a autoridade de um vigário, abrangendo várias províncias, elas mesmas incluindo várias cidades. A criação por Constantino (306-337) de novas funções administrativas (prefeitos pretorianos e condes) e a adopção do termo para designar a comunidade ou área que depende do bispo, instalado na capital de uma cidade (civitas), conduziu ao gradual abandono do seu sentido civil. Durante a Idade Média, a palavra diocese continuou a ser de uso raro e a referir apenas, na maioria das vezes, um grupo de igrejas baptismais unidas pela proximidade territorial. Quando se falava da área ou da comunidade a que se estendia a jurisdição do bispo, os textos preferiam outros termos: civitas, territorium, episcopatus, e sobretudo parochia, um termo usado ainda pelos bispos ou pelos papas reformadores do fim do século XI e início do século XII, e inclusivamente nalgumas passagens do Decreto de Graciano. O vocábulo diocese só a partir do séc. XII-XIII passou a designar exclusivamente a circunscrição sobre a qual se exercia a autoridade de um bispo. Ao mesmo tempo, acabou-se com a ambiguidade do termo parochia > paróquia, que passou a utilizar-se na sua acepção actual, designando um território organizado localmente em torno da igreja e do cemitério.
[8] T.T., Ch. D. Af. III, liv. I, fl. 3.
[9] Henrici Hostiensis, Summa aurea, lib. III (De parochiis), rubr. XXIX, n.º 1-2, Lyon 1537, fl. 392 v.º. Cf. Elisabete Zadora-Rio, «Territoires paroissiales et construction de l’espace vernaculaire», em Médiévales, n.º 49 (automne, 2005), p. 105-120.
[10] Foi importante a participação dos particulares na construção de “basílicas”, destinadas ao culto das relíquias dos santos, e na erecção de “igrejas próprias”, destinadas ao serviço religioso das populações dependentes que viviam nos seus domínios. À sua volta organizaram-se espaços, estando alguns deles na origem de futuras paróquias, quando esses templos passarem a estar na dependência dos prelados diocesanos (um estudo mais amplo desses aspectos ultrapassa o âmbito deste estudo).
[11] O princípio da subsidiariedade deve entender-se correctamente: Quando uma determinada entidade, neste caso uma pequena comunidade, não tem meios para conseguir os seus fins deve recorrer-se à autoridade que lhe está imediatamente acima, isto é, por exemplo, quando uma freguesia não tem capacidade para resolver os seus problemas ou quando os problemas ultrapassam a dimensão de freguesia, e se não lhe for possível resolvê-los em associação com outra ou outras freguesias confinantes, a que os mesmos problemas digam respeito, é de admitir o recurso a uma entidade superior, neste caso a entidade concelhia. A organização em concelhos e freguesias é, na prática, a maneira mais eficiente de resolver os problemas de uma área geográfica de dimensão limitada. Mas quando um município ou uma freguesia não tem possibilidades de resolver os seus problemas, por lhe faltarem meios, então deve recorrer ao apoio de uma autoridade imediatamente superior, por esta ordem: o município, uma instância de poder regional, o governo central. Os órgãos de poder de cada um destes níveis, por um lado, devem respeitar-se, e, por outro lado, devem colaborar uns com os outros.

*  A base deste estudo foi uma conferência proferida na Biblioteca Municipal de Caminha, 24 de Abril de 2013. Versões parciais deste trabalho foram publicadas no jornal Voz de Melgaço e na Revista de Administração Local, n.º 255, Lisboa 2013, p. 297-307.

in António Matos Reis, História das Freguesias, http://freguesias-historia.blogspot.pt/, [Consulta em 13dez2017]

I – Dos forais antigos aos forais novos

Forais Manuelinos

I – Dos forais antigos aos forais novos

1. Municípios, terras e julgados.


Quando se fala de um município ou de um concelho não se está a dizer a mesma coisa que se dirá ao falar de uma terra ou de um julgado: vocábulos que hoje, com frequência, se usam em sentido equívoco, mas que inicialmente correspondiam a realidades distintas. Convém entender o significado exacto destes termos, assim como o de outros que aparecem com frequência quando se estudam os primeiros séculos da história de Portugal.

As terras ou tenências equivaliam a circunscrições territoriais, em que esteve dividido o território, nos tempos mais recuados, para fins de organização militar: um tenens ou rico-homem estava à frente de cada uma dessas terras, cujas áreas geográficas variavam frequentemente, como verificamos pelos documentos, ao comparar o elenco dos confirmantes de diversos diplomas dos séculos XII, XIII e XIV.

Os julgados eram divisões territoriais estabelecidas para fins de administração da justiça, e tinham um juiz à sua frente – e aqui juiz entende-se já no sentido actual. Numa reunião da cúria régia, em 1211, foi determinada a criação de juízes por todo o reino, ao estipular-se que não houvesse qualquer terra que não estivesse sob a alçada de um juiz, isto é, que não estivesse integrada num julgado: nenhum habitante poderia furtar-se desde então à autoridade do juiz, ou ao seu juízo, em caso de delito ou de contenda, e muito menos cair, por usurpação, sob a alçada de autoridades estranhas, como os senhores de algum couto (domínio eclesiástico) ou de alguma honra (domínio nobre), a que a localidade onde vivia o súbdito de facto não pertencia. Ao contrário do que por vezes se tem dito, não se instituíram então os julgados, mas apenas se determinou a sua extensão a todo o reino. Há, com efeito, referências anteriores a vários julgados e muitas mais aos juízes que, pelo menos desde cerca de 1135, existiam em quase todos os municípios.

O município é uma comunidade local dotada de autonomia na condução dos seus destinos. A palavra município não aparece na antiga documentação, embora a usemos com frequência para designar aquela realidade que nos tempos recentes é costume designar com a palavra concelho, e que engloba o território, as gentes e os respectivos órgãos de governo local. Raramente a palavra concílio, sua equivalente na versão latina, aparece nesse sentido nos documentos do séc. XII e XIII. Quando se referem ao município, e sobretudo à comunidade que o integra, os documentos usam, conforme os casos, as palavras «vila», «cidade», «moradores», «habitantes», ou os plurais «vós» ou, quando é o concelho a pronunciar-se, «nós».

Nos mais antigos documentos, concelho entendia-se quer em sentido amplo – e designava a assembleia (do latim, concilium) em que se reuniam os chefes de família, para tratar dos mais importantes assuntos de interesse local – ou em sentido restrito (conselho, do latim, consilium), para designar um pequeno grupo, responsável pela condução dos destinos da comunidade. Este órgão colectivo, que representava a comunidade e tratava do seu governo, é essencial para que se possa dizer que em alguma localidade existia um município.

Com diversas designações se referiam as pessoas que compunham o conce­lho, entendido no sentido mais restrito: ou genericamente, sem lhes aplicar qualquer nome, mas supondo apenas que eram recrutadas entre os homens-bons (por homem-bom entende-se alguém que não está sujeito a qualquer tipo de dependência, familiar, económica ou social, isto é, um chefe de família que vive exclusivamente dos seus rendimentos); ou como alcaldes, no grupo de municípios que receberam um foral que teve como paradigma o de Numão; como justiças, no grupo de Tomar; ou ainda como de alvazis, designação de origem muçulmana, usada a partir de finais do século XII, nos municípios que receberam o foral de 1179.

O homem que presidia a este concelho era normalmente o juiz, mas em algumas localidades recebia outras denominações, o que por vezes correspondia à acumulação de várias funções: podia ser o alcaide, e nessa altura competiam-lhe também atribuições militares[1]; podia chamar-se alvazir ou alvazil; e um pouco mais tarde, sob a influência do incipiente estudo do direito romano em Portugal, podia ter o nome de pretor.

Por volta de 1135, como já se referiu, os municípios começaram a reivindicar, e conseguiram obter do rei, o reconhecimento do direito de escolherem eles próprios o juiz que presidia ao concelho. Esta característica contribuirá para distinguir definitivamente o município do simples julgado.

2. Forais Antigos.

Os documentos através dos quais a maior parte dos antigos municípios adquiriu existência oficial chamam-se forais[2]. O foral, em muitas circunstâncias, era o documento que iniciava ou que levava à organização de uma nova comunidade; noutros casos, reconhecia e confirmava oficialmente uma comunidade já existente. Nele se definia o território que ficava a pertencer ao município, concedendo-lhe um determinado grau de autonomia; nele se definiam as regras gerais a observar na gestão dos interesses comuns e nas relações entre os seus membros, e destes com os outros indivíduos que viviam fora do termo do concelho, e, de um modo especial, com o Rei, ou, mais raramente, com um senhorio, quando dele estavam dependentes. O foral revestia, por regra, a natureza de documento clarificador e definidor das obrigações e dos direitos fundamentais ou, como na época se dizia, dos privilégios dos munícipes. Através do foral, se favorecia o estabelecimento de novos aglomerados habitacionais ou se criavam estímulos ao desenvolvimento dos já existentes, fixando moradores, promovendo o arroteamento e a exploração das terras, incrementando as trocas económicas, criando estruturas de apoio aos viandantes, no cruzamento dos mais importantes eixos viários, facultando os mais elementares meios de protecção civil e política aos homens livres de parcos recursos económicos, contrabalançando os poderes senhoriais discricionários, de modo a cercear o seu excessivo crescimento e a evitar a subjugação dos mais fracos pelos mais fortes.

Para além da consecução destes objectivos, mais ou menos imediatos, a criação dos municípios permitiu que outros objectivos de fundo se atingissem, como o desenvolvimento económico e social de todo país, no seu conjunto, e a consolidação e defesa das fronteiras, perante as ameaças externas. Naturalmente, a criação de uma importante rede de municípios, numa fase inicial, revelou-se o instrumento mais adequado para organizar e gerir a população dos espaços rurais e dos centros urbanos, e ainda para arrecadar uma boa parte dos proventos necessários ao funcionamento do governo central. A sua distribuição, de norte a sul, por todo o território, com os respectivos centros urbanos, a sua ligação por uma rede viária sumariamente correspondente às necessidades da época, acompanhada pela realização de feiras periódicas, cada vez em maior número, proporcionou a crescente animação da economia, a produção de excedentes, a multiplicação das trocas e a circulação de pessoas e bens através do território, ao mesmo tempo que despertava e favorecia o desenvolvimento dessa consciência da unidade na diversidade, que se tornou a base do sentimento nacional.

3. Corregedores e vereadores.

Após a morte de D. Dinis, a dinâmica que até aí presidiu à história dos concelhos, começou a abrandar. Diminui consideravelmente a criação de novos municípios através da outorga de forais. Essa diminuição deve-se, por um lado, ao facto de a rede de municípios já cobrir satisfatoriamente a maior parte do território. Por outro lado, à falta de estímulo, resultante da pressão do centralismo régio, traduzido não só numa legislação que se aplicava do mesmo modo em todo o lado, sem levar em conta a história das várias comunidades e as suas especificidades, mas também na crescente intromissão dos funcionários régios, especialmente dos juízes de fora e de corregedores, nomeados pelo governo central, nos assuntos locais. A missão inicialmente atribuída a estes era a de tornar mais eficiente a justiça e a administração, corrigindo os erros, suprindo a ineficácia dos juízes locais, remediando a inépcia dos membros dos órgãos concelhios e dos funcionários municipais, mas os povos acabarão por ter razões para se queixarem das suas prepotências e das suas exorbitâncias.

A nomeação pelo corregedor de “vedores”, pouco depois designados como “vereadores”, que se reuniam, em lugar de acesso vedado ao público, para decidirem acerca do que lhes parecesse mais adequado ao governo dos concelhos, como determinava a lei que veio a ser integrada na versão de 1349 do Regimento dos Corregedores[3], não era compatível com o espírito inicial dos municípios.

A eleição dos vereadores em reunião do concelho alargada a todos os homens-bons foi definitivamente limitada pela Ordenação dos Pelouros, promulgada por D. João I, em 12 de Junho de 1391, que passou a constituir, a nível dos concelhos, o mais antigo sistema eleitoral que se conhece. Segundo essa Lei, ficava nas mãos de uma elite a condução dos destinos do município, uma vez que o exercício das funções da governação local se restringia a um grupo escolhido de cidadãos. Com efeito, determinava esta Ordenação que em cada concelho se organizassem e mantivessem actualizadas listas de pessoas idóneas para o exercício dos vários cargos municipais (juízes, vereadores, procuradores), fazendo-se um rol distinto para cada um desses cargos. O nome dos assim recenseados era escrito num papel, e este colocado numa bola de cera (o “pelouro”), por sua vez guardada numa arca – a arca dos pelouros – de onde se fazia o sorteio dos homens que exerceriam cada ano[4].

Mas nem tudo era negativo. Na realidade, embora quase se tenha deixado de outorgar forais, registava-se gradualmente no país uma evolução que aproximava e depois conduzia à municipalização de muitos territórios, dependentes do governo central, os julgados, ou de entidades não régias, até aí designados como coutos e honras. Essa evolução é testemunhada pelos processos constantes do chamado “Chamamento Geral”, posto em marcha por D. Afonso IV, através do qual somos informados da existência de cerca de duas centenas de coutos, honras e outras localidades de senhorio privado, cujos moradores elegiam o seu juiz[5]. Se isto sucedia nesses territórios, com maior força de razão havia de acontecer nos julgados, de directa dependência régia.

Dentro do que acabamos de afirmar, muitas terras, espalhadas por todo o país, transformadas em julgados e equiparadas aos antigos concelhos, não tiveram um foral anterior ao reinado de D. Manuel, e, de algum modo, podemos dizer que nem dele necessitaram. Quanto ao funcionamento das suas estruturas internas, nas relações dos munícipes entre si e com o exterior, regular-se-iam pelas leis gerais, que gradualmente se foram publicando. No aspecto fiscal e no pagamento de rendas, tomavam como referência o registo desses encargos conforme constavam das Inquirições, designadamente das Inquirições de D. Afonso II, que, a norte, foram apenas até ao rio Lima, e das Inquirições de D. Afonso III. Quando não há outros documentos, é a estas Inquirições que se faz referência, ao mencionar o foral antigo, designadamente nos processos relacionados com a outorga dos forais manuelinos.



[1] A designação alcaide remonta ao período em que a jurisdição estava concentrada nas mãos da autoridade militar, nos tempos difíceis da reconquista, durante a qual esses municípios constituíam a linha de fronteira com os territórios sob o domínio muçulmano.

[2] Não era esta a designação inicial de tais documentos. Referiam-se uma vez simplesmente como «carta», tal como a generalidade dos documentos escritos, ou como «scriptum», algumas vezes como «decretum», mas a partir de meados do séc. XII divulga-se e generaliza-se a designação de «carta de foro». Foro é, no entanto, uma designação muito genérica, aplicada a realidades diferentes. Designa muitas vezes as rendas a pagar das propriedades rústicas e urbanas, e, com frequência, mais especificamente, a importância fixa ou «cânone» a pagar anualmente pelo domínio útil das terras, nos contratos de enfiteuse ou emprazamento, chamados também contratos de aforamento. Outras vezes, «foro» designa o estatuto social, jurídico ou fiscal de uma determinada classe ou grupo social, ou de uma determinada área ou sector: foro eclesiástico, foro de cavalei­ro, foro jurídico, foro de portagens. Muitas vezes aplica-se aos documentos de que nos estamos a ocupar, isto é, àqueles cujo assunto são as instituições municipais, mas designa tanto o documento em si como o conjunto ou uma parte das prescrições nele contidas, como a tabela das «portagens» ou o censo anual a pagar para o cofre régio. As «cartas de foro» podem classificar-se em três categorias: as de alcance puramente agrário, individuais ou colectivas, que estabelecem as condições de exploração da terra e os ónus a que a mesma está sujeita; as que estabelecem o estatuto jurídico-administrativo das comuni­dades, contendo as bases da sua organização interna, e regulando as suas relações com o poder central ou com aqueles que dele partilhavam em alguns momentos; finalmente, as que estabelecem mais pormenorizadamente as regras de funcionamento interno da comunidade, e, que na sua origem, resultam de uma compilação gradual de «costumes» ou, em latim, «consuetudines», ou do registo das interpretações ou sentenças dos juízes, a partir daí utilizadas como norma ou referência paradigmática. Apenas os documentos incluídos na segunda e terceira categoria interessam, de um modo geral, para o estudo das origens dos municípios e se podem incluir no grupo dos documentos, para que desde a terceira década do séc. XIV se generaliza gradual­mente a designação de foral, que hoje usamos e já era quase exclusiva nos últimos decénios do séc. XV. Aqueles que incluímos na segunda categoria são os forais breves, designadas na Espanha como cartas pueblas ou cartas de poblacion, e é a eles que vulgarmente se alude quando se fala simplesmente em forais. Os da terceira categoria são vulgarmente designados entre nós como forais extensos e, em regra, aparecem em localidades onde já existem forais breves.

[3] T.T., Forais Antigos, m. 10, n.º 7, fl. 31-36 v.º, com data de 1332, e 37-41 v.º, com data de 1378. Transcritos em Marcelo Caetano, A Administração Municipal de Lisboa durante a Primeira Dinastia (1179-1383), 3.ª edição, Lisboa, Livros Horizonte, 1990, p. 131-137 e 138-154. Há outras cópias em Forais Antigos, m. 3, n.º 2 (Foral de Borba), e ainda no Perg.º n.º 31 da Câmara Municipal de Alvito, transcrito por João Pedro Ribeiro, Dissertações Cronológicas e Críticas, Tomo III, 2.ª parte, Lisboa, 1813, p. 93-112, versão do final do reinado de D. Pedro I ou do início do reinado de D. Fernando. Como é de prever, são múltiplas as diferenças que se notam entre as diversas versões. A sigla T.T., nesta nota e nas seguintes, designa o Arquivo Nacional da Torre do Tombo.

[4] O regime introduzido pela Ordenação dos Pelouros foi parcialmente alterado pelo Regimento dos Corregedores, em 1418, e fixado pelas Ordenações Afonsinas, em 1446-1447 (Livro I, título 23, n.os 43-47). Manteve-se em vigor pelos tempos fora, vindo a ser profundamente alterado pelos Regimentos de 1601 e 1640, que introduziu um novo sistema eleitoral, designado como sistema de eleição por pautas de apuramento. Segundo as Ordenações Afonsinas, o corregedor devia chamar à Câmara os juízes, vereadores, procurador e homens bons, para escolherem seis pessoas, que, duas a duas, separadamente, indicariam as pessoas idóneas para o exercício dos vários cargos, em rol distinto para cada um deles. Ao corregedor régio, ou ao juiz mais velho na falta de magistrado régio letrado na terra, competia, contar os votos, seleccionando os mais votados, apurando a lista ou "pauta" dos eleitos; cada um dos nomes dessa pauta era encerrado num pelouro, guardado no saco ou arca, a aguardar o oportuno sorteio, em que as bolas de cera com o nome eram retiradas por um menino com o máximo de 7 anos de idade.

[5] T.T., Chancelaria de D. Afonso IV, liv. IV, fl. 2-107. O “Chamamento geral” foi concluído no reinado seguinte: T.T., Ch. D. Pedro I, liv. I, passim (fl. 27 e ss. até 103 v.º).

in António Matos Reis, Forais manuelinos, https://sites.google.com/site/foraismanuelinos/home, [Consulta em 13dez2017]

Ver +++ em
https://sites.google.com/site/foraismanuelinos/forais-de-dom-manuel-1
https://sites.google.com/site/foraismanuelinos/listagem-dos-forais-manuelinos


A História dos Municípios

A História dos Municípios - Livro I


          Perspectivas gerais.
Ao iniciarmos esta perspectiva de conjunto sobre a história dos municípios portugueses ao longo de toda a primeira dinastia, lançaremos um olhar de relance sobre as obras mais marcantes que, nos últimos tempos, nos legaram os historiadores no âmbito desta temática e de temáticas afins, especialmente nos países da Europa que nos estão próximos e cuja produção historiográfica, por diversas razões, é mais acessível, tornando-se apta a exercer uma ampla influência sobre os estudiosos portugueses. Sem omitir outras referências, é designadamente o caso da historiografia francesa, que em tempos recentes tem dedicado uma especial atenção à história dos municípios, das cidades e das aldeias medievais, assim como à organização das comunidades rurais e urbanas, às dinâmicas do povoamento e da organização do território. Para lá da fronteira, mas por razões de vizinhança, os diversos espaços ibéricos possuem uma história que se assemelha à nossa, em virtude da existência de um passado em grande parte comum, desde as mais remotas origens até à ocupação romana, ao domínio suevo e visigótico, à presença muçulmana e à resistência moçárabe e, finalmente, às vicissitudes da reconquista; a historiografia espanhola tem-se debruçado atentamente sobre os fenómenos relacionados com a instalação e reorganização de comunidades, a seguir ao período da reconquista, e sobre os mais diversos aspectos do povoamento, em áreas geográficas tão diversificadas, como os espaços setentrionais, o noroeste, o centro, o sul e o levante hispânicos, e não podemos manter-nos alheios aos resultados, largamente positivos, dos vários estudos até agora publicados. Felizmente, também em relação a Portugal se prossegue uma frutuosa caminhada, de que se colhem os primeiros frutos, e novas e promissoras perspectivas se abrem para o futuro.

Embora muitas das obras produzidas ao longo dos séculos XIX e XX, sobretudo como reflexo da formação jurídica de vários historiadores, se tenham ocupado de aspectos institucionais que hoje não se consideram os mais candentes, há uma panóplia de temas a cuja ponderação o historiador não tem o direito de se esquivar, especialmente porque abrangem um conjunto de factores que exerceram ou podiam ter exercido uma influência decisiva na organização e no modo de vida das comunidades. Nesse âmbito, não se podem omitir as diversas teorias, expostas e defendidas por vezes com grande entusiasmo e paixão, por alguns autores espanhóis e portugueses. Sem ignorar o fecundo contributo de muitas das observações atentamente produzidas por esses autores, é possível temperá-las nos tempos actuais com novos matizes e acrescentar-lhe outros pontos de vista, que resultam das análises metódicas, ainda que nem sempre desapaixonadas, da historiografia mais recente. Pensamos em temáticas como a da origem romana dos municípios, a teoria do ermanento e a teoria da origem “germânica” do municipalismo peninsular, mas temos de considerar também as influências da herança muçulmana e moçárabe, da imigração franca e dos condicionalismos próprios dos tempos da reconquista, assim como as teorizações levadas a cabo sob a influência da doutrina marxista acerca da origem dos municípios. E também não devemos ignorar a energia criativa do próprio homem, empenhado na luta pela sobrevivência, no meio das adversidades que os indivíduos só conseguem vencer quando se reúnem em comunidade.

Ultrapassada a análise das teorias elaboradas com o objectivo de explicar as origens do municipalismo, importa, mesmo de um ponto de vista genérico, que terá de admitir a existência, em concreto, de múltiplas variantes, analisar o processo que conduziu à fundação dos municípios. Vários problemas se levantam: que objectivos gerais se pretendiam alcançar com a criação de um município, que objectivos imediatos a ela presidiram, em cada momento? Quando esses objectivos se revelavam suficientemente imperiosos para que a fundação acontecesse, a quem podia ou devia pertencer a iniciativa de a preparar ou de a concretizar? Tal iniciativa seria unilateral ou poderia englobar vários protagonistas e recolher diversos contributos? A quem competia a decisão definitiva? Uma vez tomada esta, que trâmites se lhe seguiam ou deviam seguir, na elaboração do documento fundador (e será que este sempre existiu)? Como se definiam os espaços a contemplar, a comunidade abrangida, as normas a plasmar no documento? Qual era, nesse processo, o papel reservado ao monarca ou ao magnate, de quem dependiam o espaço, a inovação e a comunidade que era destinatária do acto, e aos próprios destinatários? Numa fase imediata, que passos levavam a dar forma ao documento: quem o elaborava, de que modelos ou paradigmas dispunha, a que requisitos havia de obedecer o formulário? Seguia-se a validação do documento e a sua outorga: quais eram os intervenientes que participavam neste processo e que trâmites eram seguidos?

Após o acto fundador, o município ganhava corpo, através da criação de um conjunto de estruturas orgânicas mínimas, que lhe permitiam funcionar, garantir os necessários meios de acção, estabelecer regras e urgir o seu cumprimento. Importa analisar as relações da comunidade com o seu próprio espaço, o modo como este se hierarquizava, desde o centro até à periferia, e como dentro dele os homens se relacionavam, em sociedade, para além das inevitáveis diferenças de estatuto económico e até de classe, de sexo e de etnia. É indispensável observar como é que o município funcionava, a começar pela reunião da assembleia geral dos munícipes e a continuar na acção do restrito concelho responsável pela gestão ordinária e quotidiana, cuja constituição e evolução é necessário conhecer, pelo menos sumariamente. O seu funcionamento exigia, a partir de certo momento, o suporte de um crescente número de funcionários, de cuja natureza e funções devemos fazer uma ideia.

        A cada um destes quatro pontos se referem os capítulos que, em igual número, se vão seguir. Só depois nos abalançaremos a delinear a marcha histórica dos municípios, numa perspectiva diacrónica, ao longo desse importante período fundacional que se inicia nos tempos condais e prossegue até ao final da primeira dinastia.

in António Matos Reis -  https://sites.google.com/site/historiadosmunicipios/historia-dos-municipios, [Consultado em 13dez2017]

Historiografia

História dos Municípios I

Historiografia - Capítulo I

O estudo das instituições locais iniciou-se nos alvores do século XIX, como reflexo das transformações políticas e sociais que se tinham verificado sobretudo na Europa e alastravam um pouco por todo o mundo, levando às revoluções liberais, tendo como consequência a transformação dos regimes, a independência de novos estados e o reconhecimento crescente do papel dos cidadãos na condução da vida pública.

É nesse contexto que se realizaram os primeiros estudos tendo por objecto a história dos municípios e do seu contributo para a organização harmoniosa da sociedade. Esses estudos contemplavam em primeiro lugar os aspectos institucionais, de ordem predominantemente jurídica, mas alargar-se-iam, já no século XX, a outros sectores, designadamente às matérias económicas, sociais, militares e até simbólicas.

        1. França.

1.1. Na segunda metade do século XX, a história do povoamento, e, concretamente, do nascimento e estruturação das comunidades sobre as quais viria assentar o mundo moderno, enriqueceu-se com a multiplicação de estudos conduzidos em várias direcções: a história das cidades, das comunas, do mundo rural. A obra do historiador belga Henri Pirenne, Les Villes du Moyen Age[1], esteve nas origens do novo interesse despertado pela história dos burgos e cidades na Idade Média, e do papel desempenhado pelos burgueses e mercadores no desenvolvimento da economia e da civilização europeia. É inegável a influência exercida sobre o historiadores pel’ As cidades da Idade Média, de Max Weber, embora a sua tradução apenas viesse a ser publicada em França sessenta anos após a edição original[2].

O movimento comunal corresponde a um dos mais célebres capítulos da história urbana da Idade Média, ao ponto de se ter exagerado a sua originalidade e a sua importância[3]. Charles Petit-Dutailis, na mais conhecida obra que ao tema foi dedicada, Les Communes Françaises,  acompanha a sua evolução desde as origens até ao fim do século XVIII[4]. A história das comunas é, no entanto, uma simples parcela da história das cidades e das instituições municipais.

1.2. A história urbana levantava muitos outros problemas, a que procurou responder a historiografia do último quartel do século XX. Em 1980, sob a direcção de Jacques Le Goff, um grupo de historiadores franceses dotava-nos de um contributo imprescindível para uma visão global da história das cidades, com a publicação da Histoire de la France urbaine[5]. O volume dedicado à Idade Média divide-se em três partes, correspondentes a outros tantos períodos cronológicos, de que se ocuparam André Chédeville (1000-1150), Jacques Le Goff (1150-1330) e Jacques Rossiaud (1340-1530)[6]. Através desta obra, que tem na sua rectaguarda um vasto labor de investigação, dedicado por muitos autores ao fenómeno urbano, assistimos ao aparecimento da cidade medieval, que precede, acompanha  e segue a passagem do ano mil e se afirma especiamente ao longo do século XIII, especialmente no aspecto económico, como universo predilecto dos artesãos e mercadores, e constitui a base indispensável do florescimento cultural que, para além das crises demográficas e sociais, caracterizará especialmente o século XIV, apresentando-se como ponto de partida para o mundo moderno.

O período final da Idade Média coincide com a época áurea das bonnes villes. Esta designação, a partir de meados do século XIII, foi aplicada a centros urbanos economicamente prósperos e com formas de poder solidamente estabelecidas[7]. Bernard Chevalier alargaria o estudo das “bonnes villes” ao período que vai do século XIV ao século XVII[8]. A bonne ville, no entanto, afasta-se já do modelo típico da cidade medieval: é um centro em que predominam as funções políticas e administrativas e que atinge um significativo prestígio cultural[9]. As cidades francesas não se esgotam, porém, num só modelo, havendo, além das organizações de feição comunal, outras de índole consular e prévôtale[10].

1.3. A voga da história urbana, durante algum tempo, relegou o mundo rural para segundo plano, mas as cidades não podem isolar-se do meio que as circunda, e o  campo não deve ser entendido apenas em função do aprovisionamento do mundo urbano. No último quartel do século XX, as comunidades de aldeia ou de lugar tornaram-se objecto de estudos e de colóquios, em que se abordam os problemas económicos e sociais, os seus recursos e constrangimentos, os seus ideais e fantasmas, num plano mais geral ou no contexto mais preciso de uma determinada região[11]. Em data próxima daquela em que Georges Duby, Jacques Le Goff e os seus colaboradores promoviam a edição do volume da Histoire de la France urbaine dedicado à Idade Média, Robert Fossier, na Enfance de l’Europe, equacionava a importância da formação das aldeias, através daquilo a que chamou “l’encellulement”[12], e do contributo dessas aldeias para o nascimento de uma nova Europa, a partir do ano mil[13]. A mesma temática foi depois amplamente abordada em La Société Médiévale, em Villes et Villageois au Moyen Âge[14], e em estudos dispersos que viriam a ser reunidos em Hommes et Villages d’Occident au Moyen Âge[15].

 2. Espanha.

2.1. Na Espanha, a publicação da Coleccion de Fueros Municipales, levada a cabo por Muñoz y Romero, em meados do século XIX, constituiu a base para a elaboração posterior de obras de análise e de síntese tão importantes como as de Eduardo de Hinojosa[16], Claudio Sánchez-Albornoz[17], Rafael Gibert[18], Galo Sánchez[19] e Alfonso García Gallo[20], nas quais pesa sobretudo a perspectiva jurídica. Luís G. de Valdeavellano[21], em Origenes de la Burguesia en la España Medieval, orientou a sua investigação num sentido que ultrapassava a índole formalista e jurisdicista das obras anteriores, estudando o papel dos burgueses na origem e no desenvolvimento das cidades e “burgos” medievais da Espanha[22]. A importância dada à história local, assim como à história da economia e das sociedades, na segunda metade do século XX, levou a que gradualmente se ultrapassasse um método de estudo dos forais e de outros documentos relativos aos primórdios das comunidades locais excessivamente centrado nesses critérios jurídicos e formais.

2.2. Para além das visões de conjunto relativas a toda a Espanha e das monografias locais, têm-se multiplicado os estudos dedicados às diversas áreas regionais: Galiza, Astúrias, Vascongadas, Navarra, Aragão, Valência e Catalunha.

  Da Galiza, que já tinha merecido as atenções de A. López Ferreiro[23] e de J. Villa-Amil[24], foram objecto de publicação e estudo, por parte de E. Saez, as cartas de povoamento outorgadas pelo convento de Meira[25], e Rafael Gibert sintetizou a evolução dos foros da cidade de Santiago, entre 915 e 1346[26]. Além da atenção que lhes foi dispensada por Ermelindo Portela e F. Lopez Alsina, mereceram o estudo de J. I. Ruiz da la Peña as cartas fundacionais que, desde os últimos anos do século XII e ao longo do século XIII, os monarcas, especialmente Afonso X, outorgaram a várias povoações, incluindo a reanimação de núcleos populacionais já existentes, com o objectivo de estimular a organização administrativa e o desenvolvimento económico do respectivo alfoz, na orla marítima ou no interior[27].

 As Astúrias, no último meio século, beneficiaram do labor de historiadores como E. Benito Ruano[28] e de J. I. Ruiz de la Peña, que lhes dedicou uma série de estudos que culminaram na obra Las “Polas” Asturianas en la Edad Media[29]. Gonzalo Martinez Diez, em Alava Medieval, estudou o contexto em que se processou a organização do território cantábrico e, depois de transcrever dezanove cartas das vinte e três vilas medievais estudadas, debruçou-se sobre a história das confrarias e irmandades cívicas alavesas[30].

A J. M.ª Lacarra devem-se diversos estudos sobre os foros locais de Navarra[31], e  para o espaço aragonês é fundamental a sua obra de recolha e publicação de textos[32]. M. Graal dedicou a sua atenção ao estudo das cartas de povoamento do reino de Valência[33].

Embora Próspero de Bofarull já tivesse publicado, no século XIX, uma colectânea de documentos que incluía um significativo número de cartas pueblas e algumas “franquiezas” relativas a Aragão e à Catalunha[34], só em data mais recente José M.ª Font Rius levou a cabo a publicação sistemática e o estudo das fontes relativas ao povoamento da Catalunha[35].

  2.3. Nas últimas décadas assistimos a um tal afã de publicação de textos, que hoje deve ser escasso o número de forais, de cartas de povoamento ou de outros documentos semelhantes, em toda a Espanha, que ainda não tenham sido editados[36]. No entanto, a dispersão e a grande variedade das publicações em que foram apresentados constituem para quem os deseja estudar uma grande dificuldade, recentemente minorada com a publicação de um extenso catálogo, a cargo de Ana Maria Barrero García[37], que faz uma vasta recensão dos foros outorgados na Península Ibérica, e, em geral, das obras onde foram publicados, sem, no entanto, mencionar as fontes documentais[38].

  Tal como a França, a Espanha conheceu, nas duas últimas décadas, um redobrado interesse pelo estudo do povoamento e da organização do espaço. Depois da obra dada à estampa, em 1968, em que Maria del Carmen-Carlé se empenhava numa visão panorâmica sobre a origem, a constituição e a evolução do município castelhano-leonês na Idade Média[39], a investigação tem sido aprofundada nas mais diversas áreas e sob múltiplas perspectivas.

2.4. Em 1984 veio a público a edição em língua castelhana de Estructuras feudales y feudalismo, em que Reyna Pastor se ocupava da relação entre comunidades de aldeia e senhorios, no norte da Península, do século X ao século XIII[40]. Em 1985, dando sequência a vários trabalhos monográficos de García de Cortázar, e sob a sua coordenação, apareceu a obra Organización social del espacio en la España medieval[41].

O II Congreso de Estudios Medievales, que, em 1989, teve lugar na cidade de León, foi expressamente dedicado ao tema dos Concejos y Ciudades en la Edad Media Hispanica[42], e as respectivas actas fornecem uma panorâmica das principais aquisições dos historiadores no domínio da história dos municípios, cidades e vilas, e testemunham o interesse do conhecimento do mundo rural medievo para compreender a orgânica do povoamento do território e o funcionamento dos municípios[43].

Apreciáveis contributos para o estudo da mesma temática se colhem nas actas das III Jornadas Burgalezas de História, dedicadas ao tema Burgos en la Plena Edad Media[44], e, posteriormente, nas das sessões da reunião científica destinada a comemorar os novecentos anos do foral de Logroño[45]. O IV Congreso de Estudios Medievales com que em 1993 se assinalou o centenário do nascimento de Claudio Sánchez-Albornoz elegeu como tema a Despoblación y Colonización del Valle de Duero, alargado a um aro cronológico que vai desde a arqueologia tardo-romana até à União Europeia, cujo interesse no âmbito da nossa investigação é suficientemente justificado pela meia dúzia de comunicações dedicadas à Idade Média[46].

 3. Portugal.

3.1. O estudo da história dos municípios iniciou-se em Portugal, como noutros países europeus, na primeira metade do século XIX, servindo-lhe de pano de fundo as transformações introduzidas pelo Liberalismo no âmbito da administração pública, como noutros sectores da vida portuguesa, os vários acontecimentos que marcaram a sua implantação e os sobressaltos vividos no início do novo regime[47].

Não se pode iniciar o estudo da história das instituições municipais sem evocar aquele que foi o seu percursor em Portugal: Alexandre Herculano. Implicado na sublevação do Regimento de Cavalaria 4 de Lisboa, em 21 de Agosto de 1831, Alexandre Herculano conseguiu escapar ileso para a Inglaterra, de onde passou à França. Em Rennes frequentou a biblioteca pública, familiarizando-se com as mais recentes novidades literárias europeias. Estavam em voga os estudos históricos de Thierry, que lhe forneceram a perspectiva histórica da revolução liberal, em que Herculano se comprometera. Augustin Thierry (1795-1856) foi durante muitas décadas uma referência obrigatória para os historiadores franceses e europeus, entre os quais se conta Alexandre Herculano. De entre os seus escritos mereceram a atenção dos contemporâneos especialmente as Lettres sur l'Histoire de France[48], cuja primeira edição é de 1837, e o Essai sur l'histoire de la formation et des progrés du Tiers État[49]. Se as Lettres sur l'Histoire de France tiveram eco nas Cartas sobre a História de Portugal, publicadas na Revista Universal Lisbonense, em 1842[50], o Essai sur l'histoire de la formation et des progrés du Tiers État serviu de modelo a Herculano para a elaboração da parte mais significativa da História de Portugal[51]. A Thierry se deve o interesse pelas chartes municipales, que está nas origens de uma intensa actividade de leitura, publicação e análise de textos que prossegue no nosso tempo e se reflectiu no empenho com que Alexandre Herculano encarou a publicação dos forais, nos Diplomata et Chartae e nas Leges et Consuetudines dos Portugaliae Monumenta Historica. Nas Lettres sur l’Histoire de France, Thierry fez a história do Terceiro Estado, a que se ficou a dever a Revolução Francesa, colocando as suas origens nos municípios romanos, que, sobrevivendo à derrocada do Império, reergueram as muralhas derrubadas pelos invasores bárbaros, se defenderam contra a rapina dos senhores feudais, arrancaram pela insurreição as cartas de foral, deram acolhimento aos servos fugitivos, elegiam os seus magistrados e se educavam na liberdade e no trabalho.

As Lições sobre a História da Civilização na Europa, em que Guizot se ocupou da ascensão do Terceiro Estado[52], exerceram também grande influência na mente de Herculano, especialmente quanto ao papel atribuído às comunas na afirmação da democracia.

Além de Thierry e de Guizot, outros autores guiaram Alexandre Herculano no estudo da história dos municípios. Em nota de rodapé, colocada no início da Parte I do Livro VIII, da História de Portugal, o historiador menciona, entre as obras que lhe serviram de apoio no estudo das instituições municipais romanas, Guizot e Savigny. Roemich Rechts in Mittelalter, de Savigny, é mesmo a obra mais citada ao longo do Livro VII da mencionada História de Portugal.

Regressando a Portugal, integrado no grupo de sete milhares e meio de bravos que desembarcaram no Mindelo (em Pamplido), Herculano trazia na sua bagagem cultural as ideias em que irá amadurecendo o seu projecto de História de Portugal, cuja preparação iniciará em 1843 e apresentará à luz do dia a partir de 1846[53].

A redacção da História de Portugal contribuiu para a clarificação das suas ideias municipalistas, que, já esboçadas em 1851, defenderá expressamente contra as tendências da Regeneração, em 1853, e estarão presentes na sua obra até ao fim da vida. Embora Herculano o não tenha sistematizado, António José Saraiva, reunindo diversas passagens da sua obra, conseguiu definir, de modo esquemático o seu pensamento sobre esta matéria[54].

Os municípios medievais tornaram-se para o nosso historiador o modelo a seguir pelos municípios da sua época: “Representam eles, de um modo verdadeiro e eficaz, a variedade contra a unidade, a irradiação da vida política contra a centralização, a resistência organizada e real da fraqueza contra a força, resistência que a irreflexão ou a hipocrisia dos tempos modernos confiou à solene mentira das garantias individuais, ao isolamento do fraco diante do forte, ao cidadão e não aos cidadãos, ao direito indefeso e não ao direito armado”[55].

A coluna dorsal que orienta o pensamento municipalista de Herculano aproxima-se das mais actuais concepções sobre a subsidiariedade que deve regular as relações entre as várias instâncias do poder: “A administração da localidade pela localidade deve chegar até ao último limite em que não repugna ao direito das outras localidades constituídas uniformemente. A administração central abrange tudo o que fica além desses limites no regímen prático da sociedade”[56]. Num artigo publicado em O Português, expõe a ideia de que o homem vulgar não é capaz de entender a pátria para além dos limites do concelho onde nasceu e onde vive, e de que a grande pátria, que inclui a totalidade do território português, não passa de uma abstracção para a maior parte dos seus habitantes. O cidadão comum, se por um lado não se encontra preparado para enfrentar os problemas políticos e económicos à escala nacional, sente-se apto a pronunciar-se sobre os problemas do seu concelho e a escolher entre os seus conterrâneos aqueles que devem gerir os interesses colectivos. Por outro lado, o poder repartido pelos concelhos, com governantes eleitos e controlados pelas populações, era o melhor antídoto contra a prepotência dos governos centrais, facilmente dominados por oligarquias, interessadas em exercer o poder em benefício dos seus interesses pessoais e de grupo. Sem entrar em tanta minúcia, Herculano aproximou-se destas ideias no início da Parte I do Livro VII da História de Portugal.

Para entender a realidade e a variedade dos municípios medievais, partiu Herculano do pressuposto de que os seus antepassados eram os municípios romanos, que, pela sua força interna, sobreviveram às dificuldades resultantes das invasões bárbaras e da conquista muçulmana. Da maior ou menor semelhança com a estrutura que entendia ser a do município romano, resultavam as diferenças que o levaram a distribuir os antigos municípios portugueses por várias categorias. Não se apercebeu de que ao eleger por modelo o município romano, construído sobre a diferença entre duas classes de munícipes – os decuriões, cidadãos de pleno direito, e os plebeus que constituíam a massa da gente comum – contrariava a sua doutrina acerca da igualdade democrática de todos os cidadãos, sobre a qual baseava a unidade e a força do município. Tomando este figurino como referência, conforme neles se encontram total ou parcialmente as magistraturas equivalentes às do município romano, Herculano distribuiu em três categorias os concelhos medievais portugueses, repartindo-os em vários subgrupos. Os três principais grupos são:

– os concelhos perfeitos ou completos;

– os concelhos imperfeitos, e

– os concelhos rudimentares.

 Os concelhos perfeitos ou completos seriam os que mais se aproximavam do estereótipo romano: assim como nos municípios romanos a população era constituída por decuriões e privados, também nestes municípios os habitantes se repartiam em cavaleiros vilãos e peões; assim como, nos municípios romanos, a máxima autoridade competia aos duúnviros e quatuórviros, também aqui era exercida pelos alcaldes, alvazis ou juízes, a respeito de cujo número Herculano diz que geralmente são dois mas que não faltam exemplos de serem quatro ou mais.

Em contraste, na maioria dos concelhos que designou como imperfeitos, Herculano encontrou uma sociedade igualitária, cujos membros eram exclusivamente peões ou tributários, nas três primeiras fórmulas, ou burgueses, na quarta fórmula, apresentando como uma excepção a quinta fórmula, onde a existência simultânea de peões e cavaleiros vilãos contrastava com “o incompleto das magistraturas e, de ordinário, o menor número de garantias e privilégios que se lhes concedem”[57].

As contradições da teoria e da práxis do liberalismo contaminaram deste modo a própria concepção histórica de Herculano. É que, não obstante a Constituição de 1822 estabelecer que “Todos os portugueses podem ser admitidos aos cargos públicos, sem outra distinção que não seja a dos seus talentos e das suas virtudes” (art.º 12.º), o artigo 34.º, ponto II, exclui da possibilidade de serem eleitos “Os que não têm para se sustentar renda suficiente, procedida de bens de raiz, comércio, indústria ou emprego”. E a Carta Constitucional de 1826 excluía da capacidade de votar desde as Assembleias Paroquiais, além de outros, “Os que não tiverem de renda líquida anual cem mil reis, por bens de raiz, indústria, comércio ou empregos” (art.º 65.º, § 5), e de ser eleitos para deputados “os que não tiverem quatrocentos mil reis de renda líquida” (art.º 68.º, § 1).

O historiador debatia-se entre uma concepção que descobria no voto do povo o meio mais eficaz para combater as oligarquias e uma perspectiva romântica que, buscando os seus modelos nos tempos considerados áureos da civilização romana, acabava por triunfar na sua mente, não obstante o paralelismo que se lhe podia descobrir com os desequilíbrios sociais e políticos do momento.

 3.2. Embora a doutrina que defendia a origem romana do municipalismo português fosse contestada, já em 1868, por Teófilo Braga[58], naturalmente sob a influência de Muñoz y Romero[59], Henrique da Gama Barros[60], na História da Administração Pública em Portugal[61], seguiu de perto Alexandre Herculano, ainda que sem ir tão longe no papel atribuído ao município romano como antepassado e paradigma do município medieval. Nunca utilizou a terminologia do mestre, que classificava os municípios de mais ou menos perfeitos conforme se avizinhassem mais ou menos da organização do município clássico. A única divisão que expressamente acolheu foi a dos três grandes tipos que seguem os modelos ditos de Salamanca, Ávila e Santarém[62].

Gama Barros reconheceu o importante papel da tradição romana, pois “o regímen municipal, mais ou menos profundamente caracterizado, atravessando o período visigótico e arábico, atesta esse influxo de um modo indubitável, mostrando ao mesmo tempo o largo quinhão que lhe deve ter cabido na formação do direito local”[63]. Mas a herança romana não teve um carácter exclusivo, devendo, em seu entender, considerar-se uma série de contributos de várias origens:

1 – usos e hábitos, cuja origem se perde na escuridão dos tempos;

2 – a tradição romana, mantida na legislação visigótica e no governo municipal;

3 – os antigos costumes germânicos, que os legisladores não tinham sancionado na legislação geral, mas que se conservaram, resistindo com tenacidade ao influxo da tradição romana;

4 – a influência da Igreja, designadamente do Direito Canónico;

5 – finalmente, os costumes dos moçárabes e a acção constante do tempo.

Gama Barros admitia, no entanto, que “precisar com exactidão os costumes que remontam a cada uma dessas origens é intuito que supomos irrealizável, modificados e confundidos como eles foram necessariamente por um sem número de causas diversas, que nos ocultam a sua proveniência primitiva”[64].

 3.3. Alberto Sampaio conta-se também no número dos historiadores portugueses que se deixaram influenciar pela teoria de Alexandre Herculano sobre as origens romanas das nossas instituições municipais[65]. Procurou, no entanto, ir mais além, estabelecendo o nexo entre as vilas romanas e as freguesias, que, em número variável, integram os municípios actuais. Utilizando, para além das fontes escritas, os dados fornecidos pela arqueologia, pela toponímia e por outras ciências, apresentou-se como um verdadeiro percursor da metodologia histórica mais recente.

Para Alberto Sampaio, a base administrativa dos territórios conquistados pelos romanos eram os conventus administrativos, que se sobrepuseram a outras realidades mais antigas, as civitates, constituídas por grupos baseados em afinidades étnicas e com organização autónoma. Quando dispunham de uma fortificação, um oppidum, tinham já adquirido um estádio de desenvolvimento mais avançado. A acção dos romanos orientou-se para a criação de cidades abertas, as urbes, em que se centralizava o governo do território. Introduzindo na região as suas formas de propriedade e os processos de exploração do solo, numa economia que de pastoril se tornava predominantemente agrícola, as melhores terras foram transformadas em grandes villas, tendo à frente um dominus, que dirigia o seu cultivo. Tais villas não foram destruídas pelas invasões bárbaras e muçulmanas, mas, sofrendo diversas transformações, adaptando-se e passando a outras mãos, chegaram ao tempo das presúrias, com os antigos escravos transformados em adscripti e em ingenui – reguengueiros e herdadores. Estas villas deram origem às freguesias rurais, através da constituição das paróquias[66]. Com efeito, os antigos habitantes das villas mantinham-se unidos através do laço jurídico que os ligava ao dominus, mas, desfeito esse, “só os podia agremiar de novo quem representasse poder superior, e tal estava reservado ao pároco, que chamava a todos, sem distinção de classes, seus fregueses”[67]. Esta organização, de base eclesiástica, constituiu apenas o ponto de partida, pois cedo a villa se apresentou como pequena comuna rural, pois os fregueses, “filhos da igreja”, em virtude da sua união formavam uma molécula social distinta. Tal feição é revelada pela presença de ”um personagem, cujas competências o tornam ao menos contemporâneo dos primeiros progressos das armas cristãs, ou talvez da força das circunstâncias” que o fizeram aparecer para responder à desordem ocasionada pelas invasões sarracenas, ”quando os habitantes das vilas se viram sem governo”. Essa personagem é o judex ou juiz. Se os textos levam a concluir que alguns juízes eram de nomeação régia, na generalidade, diz Alberto Sampaio, “o mais presumível é serem de mera eleição popular”[68]. Os poderes exclusivos do dominus estavam agora repartidos pelas mãos do abade e do juiz, para as quais transitava o governo espiritual e secular da antiga villa romana[69].

3.4. Na primeira obra que dedicou à história dos municípios, Torquato de Sousa Soares seguiu de perto a teoria de Alexandre Herculano, excluindo, porém, os excessos de romanismo[70]. Dividiu, inicialmente, os concelhos medievais em três categorias: rurais, urbanos e distritais, mas, em trabalhos posteriores, reviu e simplificou esta classificação[71], distinguindo apenas dois grandes grupos: os concelhos rurais e os concelhos urbanos.

No grupo dos concelhos rurais reuniu um sem número de localidades, todas situadas a norte do Douro, admitindo a existência de concelhos deste tipo nas Beiras, de que, porém, não citou exemplos. A população destas localidades era constituída por um reduzido número de povoadores, aos quais, por um contrato enfitêutico, era colectivamente aforada uma parcela de território. A sua autonomia entrevê-se nas cartas de povoamento através da referência a um magistrado dotado de poderes jurisdicionais, o juiz local, e/ou a um simples exactor fiscal, o mordomo; correspondem, segundo o mesmo autor, às três primeiras categorias de concelhos rudimentares ou imperfeitos de Herculano.

No grupo dos concelhos urbanos, Torquato Soares incluiu seis categorias: os burgos e os concelhos que receberam forais segundo os tipos de Coimbra-1111, Coimbra-Santarém-Lisboa-1179, Salamanca-Guarda, Ávila-Évora e Zamora[72].

3.5. Paulo Merêa distanciou-se da teoria de Herculano sobre a origem romana dos municípios, observando que “Herculano, seduzido pela obra célebre de Savigny, se convenceu de que estas instituições eram uma herança do mundo romano, e preocupado em salientar as analogias meramente exteriores entre o município antigo e o concelho medieval e em estabelecer, de um modo forçado, o nexo entre um e outro, descurou alguns aspectos fundamentais”[73]. Tomando em consideração as investigações em curso, Merêa diz-se levado a crer que “é no concelho rural que devemos procurar a organização municipal originária, cujo aparecimento terá obedecido principalmente a razões de ordem económica”. “A existência de montes e pastos baldios, a necessidade de organizar o seu aproveitamento, bem como a de regulamentar a exploração agrária e pecuária do património de cada um dos vizinhos, teriam sido, dentro deste ponto de vista, as determinantes decisivas duma estrutura municipal rudimentar”[74]. Além das razões económicas, são de considerar as razões de ordem política, não se podendo negar “o papel que nesta evolução desempenharam as circunstâncias especiais da reconquista”. E, a este propósito, cita Alexandre Herculano: “quando se diligenciava dar incremento a uma povoação importante, formada por homens livres, a ideia de cercar os seus moradores de um certo número de garantias, de os revestir de certos direitos, de os fazer contribuir para a segurança e prosperidade da monarquia que se dilatava, trazia naturalmente as instituições municipais mais ou menos completas”[75]. Não deixa de registar os sinais da influência germânica no nosso direito medieval, designadamente a vingança privada, relacionada com a faida ou situação de inimizade; a composição pecuniária, a que corresponde a calumpnia ou coima em dinheiro; a assembleia judicial (o mallum) originária do concilium ou placitum; e a prova judicial através, por exemplo, das ordálias, para reforçar ou suprir o depoimento das testemunhas[76]. A influência do direito romano verificou-se numa época mais tardia, em consequência do renascimento do seu estudo, com os glosadores da escola de Bolonha[77].

 3.6. No âmbito da sua actividade universitária como professor de História do Direito, Marcelo Caetano levou a cabo alguns trabalhos de investigação no domínio da história dos municípios, entre os quais sobressaem A Administração Municipal de Lisboa durante a Primeira Dinastia e O Concelho de Lisboa na Crise de 1383-1385[78]. Esses trabalhos terão contribuído para a elaboração da perspectiva global da história dos municípios medievais patenteada na História do Direito Português[79]. Abordando a problemática da origem dos concelhos, Marcelo Caetano reconhece que “a tese que os filia no município romano se apresentava em termos sedutores, tantas são as semelhanças encontradas entre os dois tipos de organização local”. Acha, no entanto, que se aproxima mais da verdade a doutrina de Sánchez-Albornoz segundo a qual, como já tinha afirmado Lévi-Provençal, os vestígios das instituições municipais romanas que se tinham conservado até ao fim da monarquia visigótica desapareceram durante a ocupação muçulmana e também se não mantiveram no reino das Astúrias[80]. E, tal como Sánchez-Albornoz, Marcelo Caetano conclui que os concelhos peninsulares que surgiram no período da reconquista foram um produto da sua época e das circunstâncias que se viviam no país e não uma consequência ou imitação de instituições anteriores.

 3.7. José Mattoso dedicou uma atenção especial à história dos municípios medievais, na segunda parte do primeiro volume da obra Identificação de um país[81], sem que isso o impedisse de publicar outros estudos dedicados à mesma temática, designadamente os que foram posteriormente reunidos no livro Fragmentos de uma composição medieval[82], em que se abordam aspectos tão diversos como o contributo dos moçárabes, o papel das comunidades primitivas na dinâmica municipal da Idade Média, e ainda as relações entre os municípios e o mundo feudal. Para entender os mecanismos que levaram os concelhos a desempenhar uma função importante na história do país e na definição da fisionomia que ele veio a adquirir, é necessário averiguar como eles se formaram. Depois de reconhecer que a teoria romanista de Alexandre Herculano já estava posta de lado a partir do momento em que Torquato Soares abdicou da sua defesa na reedição do 1.º volume da História da Administração Pública de Henrique da Gama Barros, Mattoso regista a contribuição que para o estudo da história dos municípios terão dado as posições marxistas, em aspectos contraditórias[83], de A. Borges Coelho[84], em Portugal, e de Reyna Pastor de Togneri[85], na Espanha, a que, no entanto, considera que são de opor algumas reservas, como, apesar de imbuído da mesma ideologia, já fizera Armando de Castro.

  3.8. Os forais, os municípios, o povoamento e a organização do território português na Idade Média foram levados em conta por estudiosos como J. M. Font Rius[86], Ana M. Barrero García[87], James Powers[88] e J. A. García de Cortázar[89]. Mas é um grupo de historiadores franceses, liderado por Robert Durand, que lhes têm prestando a melhor atenção, no âmbito de vários trabalhos de investigação sobre o espaço português nos tempos a seguir à reconquista. Robert Durand publicou uma extensa obra sobre Les Campagnes Portugaises entre Douro et Tage aux XIIe et XIIIe siècles[90], e é, além disso, autor de vários estudos sobre a mesma temática[91]. Como o título da obra acima mencionada refere, o objecto da sua pesquisa é a vida no mundo rural do Portugal que resultou das campanhas contra a ocupação muçulmana, que, por uma questão de método, restringe ao espaço delimitado pelos rios Douro e Tejo. Segundo Durand, vários factores contribuíram para o atraso desses estudos em Portugal, como a carência de investigações no âmbito da arqueologia rural e da polinologia e um certo temor reverencial que desencorajou a investigação, na medida em que se consideravam como definitivos os estudos de três eruditos do fim do século XIX e começo do século XX, designadamente Alexandre Herculano, Henrique da Gama Barros e Alberto Sampaio[92]. O historiador francês sentia-se mais livre e motivado, por não estar sujeito a esse constrangimento e pelo estímulo de autores como G. Duby, que, apesar dos brilhantes resultados das suas investigações sobre matérias semelhantes, as considerava sempre como provisórias. Em Les Campagnes, para além da introdução, em que se faculta uma panorâmica da geografia e da história do território até à reconquista, Robert Durand estuda uma multiplicidade de aspectos que vão desde a dinâmica do povoamento e a evolução das técnicas agrárias até à história económica e social. Revela-se de grande interesse, nessa perspectiva, o capítulo dedicado ao vigor das comunidades, em que se realça o papel dos vários níveis de organização: a vila, a aldeia, o município[93].

Stéphane Boisselier interessou-se pelo espaço localizado a sul do Tejo[94], e a sua obra, dividida igualmente em três partes, inclui na primeira as matérias equivalentes às da introdução de R. Durand, em cuja esteira prossegue, acentuando, porém, o peso da influência islâmica, a que se segue a análise das transformações ligadas ao repovoamento cristão. Na segunda parte, estuda a organização da sociedade meridional medieva e a seguir debruça-se sobre a economia, mais concretamente sobre a estrutura e a evolução da propriedade, as culturas e as técnicas de cultivo, os modos de produção e a valorização das terras. O último capítulo da primeira parte é dedicado ao povoamento cristão, procurando estabelecer, no final, as relações entre a alcaria e a aldeia. Na segunda parte, uma boa extensão do capítulo dedicado aos quadros sociais e políticos do mundo rural cristão, é dedicada ao estudo do concelho, “lugar de solidariedades”.

Em 1999, em homenagem a Robert Durand, por altura da sua passagem à aposentação como docente, um grupo de colegas e antigos alunos promoveu um jornada de estudos em sua homenagem, na qual os trabalhos apresentados versavam, na sua maioria, temáticas relacionadas com o povoamento rural português, na Idade Média[95].

 3.9. Como indicador de um interesse renovado pela história do municipalismo, em Portugal, pode referir-se a realização, em 1985, de uma reunião pública que pela primeira vez se dedicou ao estudo desta matéria: as Jornadas sobre o Município na Península Ibérica (Séculos XII a XIX), cuja Comissão Executiva foi presidida pelo Prof. Doutor Humberto Baquero Moreno[96], por iniciativa da Câmara Municipal de Santo Tirso, para comemorar os 150 anos de fundação do concelho.

 Humberto Baquero Moreno, em cuja bibliografia se contam estudos essenciais para o conhecimento dos concelhos medievais, dirigiu durante vários anos, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, um seminário sobre a história dos municípios, no âmbito dos cursos de Mestrado em História da Idade Média, pelo qual passaram vários alunos, em cujas investigações se haviam de reflectir posteriormente as suas orientações e ensinamentos[97]. Não se pode ignorar também o valioso contributo dos trabalhos publicados por José Marques, docente dos mesmos cursos de Mestrado.

Noutras universidades portuguesas, a história dos municípios medievais continua a  merecer frutuosa atenção, designadamente na Universidade Nova de Lisboa, com José Mattoso, a que já fizemos referência, e com António de Oliveira Marques, impulsionador dos estudos dedicados às cidades medievais; na Faculdade de Direito, onde José A. Duarte Nogueira prolongou a tradição dos juristas que se ocuparam da história dos concelhos, e em Coimbra, onde a história dos municípios muito deve a  Maria Helena da Cruz Coelho[98].

        
[1] A primeira edição desta obra foi publicada em inglês, com o título Medieval Cities – Their origins and the revival trade. A tradução para português foi executada a partir da versão francesa: Henri Pirenne, As cidades da Idade Média, Lisboa, Publicações Europa-América, 2.ª ed., 1964.

[2] Max Weber, La Ville, Paris, Aubier, 1982.

[3] André Chédeville, De la cittè a la ville, em Histoire de la France Urbaine. 2. La ville médiévale, des Carolingiens à la Renaissance, Paris, Ed. du Seuil, 1992, p. 29-164.

[4] Charles Petit-Dutailis, Les Communes Françaises, 2.e ed., Paris, Albin Michel, 1970.

[5] Georges Duby (direction), Histoire de la France urbaine, t. 2: L. Le Goff (direction), La ville médiévale, des Carolingiens à la Renaissance, Paris, Ed. du Seuil, 1992.

[6] A. Chédeville analisa a lenta génese do novo modelo urbano, caracterizado pela primazia das funções económicas, nos anos que antecederam e seguiram o dobrar do milénio (André Chédeville, De la citè à la ville, ibidem, p. 29-181). Esta cidade (ville), povoada de mercadores e mesteirais, alcança o apogeu entre 1150 e 1330, fase que Jacques Le Goff analisou particularmente (Jacques Le Goff, L’apogée de la France urbaine médievale, ibidem, p. 183-405), para além de ter supervisionado toda a obra. O último destes períodos, cujo estudo coube a J. Rossiaud (Jacques Rossiaud, Crises et consolidations, ibidem, p. 407-613), engloba anos de crises violentas mas também de consolidação: a cidade afirma-se no plano cultural, colocando em segundo plano os aspectos institucionais, económicos e militares; impõe os seus modelos éticos ao conjunto da sociedade, assumindo-se como estado de espírito e não apenas como lugar de produção e de troca.

[7] Gérard Manduech, La bonne ville, origines et sens de l’expression, em AESC, 1972, p. 1441-1448.

[8] Bernard Chevalier, Le Bonnes Villes de France du XIV.e au XV.e siècle, Paris, Aubier, 1982.

[9] Como bem adverte B. Chevalier, não se trata de um ressurgimento da cidade antiga, mas da formação de um novo modelo, que tem de ser entendido no quadro do nascente estado moderno, no seio do qual se virá a desenvolver e consolidar.

[10] Os historiadores das instituições medievais retomaram recentemente à divisão da França em três regiões: o norte, área das “comunas”, o sul, zona dos “consulados” e o centro, de menor difusão da revolução municipal do século XII, onde, com certas variantes, predominava a “ville de prévoté” (Jacques Le Goff, L’apogée de la France urbaine médievale, cit., p. 276-277). O “prévôt”, nomeado pelo rei ou pelo senhor, detinha a máxima autoridade nas centros urbanos, em que prevalecia esse tipo de organização. Na “ville de consulat” o poder era exercido colegialmente por um grupo, geralmente de índole oligárquica (milites), ligado por um juramento (Idem, ibidem, p. 279).

[11] Sirvam de exemplo J. Chapelot et R. Fossier, Le Village et la Maison au Moyen Âge, Paris, Hachette, 1979; Monique Bourin, Robert Durand, Vivre au Village au Moyen Âge. Les solidarités paysannes du XI.e au XIII.e siècle, Paris, Messidor / Temps Actuels, 1984; M. Bourin-Derruau, Villages médiévaux en bas Languedoc (X.e-XIV.e siècle), 2 vol., Paris, L’Harmattan, 1987; G. Comet, Le Paysan et son outil: essai d´histoire technique des ceréales (France, VIII.e-XIII.e siècle), Aix-en Provence, Université de Provence, 1987; Gérard Sivery, Terroirs et Communautés Rurales dans l’Éurope Occidentale au Moyen Âge, Presses Universitaires de Lille, 1990. A recente obra de Daniel Pichot,Le village éclaté. Habitat et société dans les campagnes de l’Ouest au Moyen Âge (Paris, Presses Universitaires de Rennes, 2002) complementa os dados fornecidos pela documentação escrita com os elementos disponibilizados pela arqueologia, para analisar o fenómeno da multiplicação das aldeias a partir do ano mil.

[12] Embora possa ter inspirado a adopção do vocábulo encelullement, há diferenças fundamentais entre esse fenómeno e o do incastellamento, que mereceu o interesse dos historiadores nas últimas décadas. Esse movimento, de origem senhorial, orientava-se no sentido de concentrar a população em recintos fechados, chamados castra (mas não castelos, na acepção militar do vocábulo), com a outorga de cartas através das quais os senhores feudais pretendiam atrair e concentrar os homens. Cf. especialmente Pierre Toubert, Les structures du Latium médiéval et la Sabine du IX.e siècle a la fin du XII.e siècle, 2 vol., Roma, 1973; Idem, Castillos, señores y campesinos en la Italia medieval, Barcelona, Editorial Crítica, 1990. Recentemente têm sido publicados diversos trabalhos de investigação sobre esta temática, que se valem especialmente dos estudos arqueológicos: Chris. Wickham, Il problema dell iíncastellamento nell’Italia centralle. L’esempio di San Vincenzo al Volturno, Università degli Studi di Siena, 1985; Juan Antonio Quiros Castillo, La Valdinievole nel Medioevo. “Incastellamento” e archeologia, del potere nei secoli X-XII, “Quaderni della Biblioteca Capitolare di Pescia” 5, Pisa, 1999; Roberto Bernacchia, Incastellamento e distretti rurali nella Marca Aconitana (secoli X-XII), Spoleto (Quaderni della Rivista di Bizantinistica, 5), 2002; Étiene Hubert, “L’incastellamento” en Italie Centrale. Pouvoirs, territoire et peuplement dans la vallée du Turano au Moyen Âge, École Française de Rome, 2002. Nas últimas décadas, a mesma problemática tem sido objecto de certames, de que resultou a publicação de alguns volumes de actas: Lo scavo archeologico di Montarrenti e i problemi dell’incastellamento medievale (Atti del Convegno Internazionale di Studi, Siena, 1988), Firenze, 1990 (Revista Archeologia Medievale XVI, 1989); L’incastellamento (Actes des Rencontres, Gérone, 26-27 Novembre 1992, sous la direction de Miguel Barcelò et Pierre Toubert), École Française de Rome, 1998; L’incastellamento in Liguria, X-XII secolo. Bilancio e destini di un tema storiografico, Atti della giornata di studi, Rapallo 26 aprile 1997), Bordighera, 2000.

[13] Robert Fossier, Enfance de l’Europe, 2 vol., Paris, Presses Universitaires de France, 1982.

[14] Robert Fossier, La Société Médiévale, Paris, Armand Colin, 1991 (2.ª ed., 1994); Idem, Villes et Villageois au Moyen Âge, Paris, Éditions Christian, 1995.

[15] Robert Fossier, Hommes et Villages d’Occident au Moyen Âge, Paris, Publications de la Sorbonne, 1992. As propostas inovadoras e, sob alguns aspectos, polémicas de Robert Fossier estimularam o aparecimento de novos estudos, sínteses e propostas, incentivando a discussão e influenciando a realização de colóquios, como o XX.e Congrès de la Société des Historiens Médiévistes de l’Enseigment Supérieur Public, realizado em Caên, em Junho de 1990 (Société des Historiens Médiévistes de l’Enseigment Supérieur Public, Villages et Villageois au Moyen Âge, Paris, Publications de la Sorbonne, 1992).

[16] Eduardo de Hinojosa, Origenes del régimen municipal en León y en Castilla, em Estudios sobre la Historia del Derecho español, Madrid, 1903, p. 65-70.

[17] Entre a vasta obra de Claudio Sánchez-Albornoz, na qual não faltam referências a esta temática, podemos citar especialmente a Repoblación del Reino Asturleonés, em “Cuadernos de Historia de España”, 53-54 (1971), p. 236-459, e El Régimen de la Tierra en el Reino Asturleonés hace mil años, Universidad de Buenos Aires, Instituto de Historia de España, 1978, ambos republicados em Claudio Sánchez Albornoz, Viejos y Nuevos Estudios sobre las Instituciones Medievales Españolas, Madrid, Espasa-Calpe, vol. II e III, 1976 e 1980, respectivamente, p. 579-790 e 1315-1521. No próximo capítulo referir-se-á especialmente a Ruina y Extinción del Municipio Romano en España e Instituciones que le reemplazan, Buenos Aires, Facultad de Filosofía y Letras, 1943.

[18] Rafael Gibert, El Derecho Municipal de León y Castilla, «A.H.D.E», 31 (1961), 695-753.

[19] Galo Sánchez, Para la historia de la redacción del antiguo derecho territorial castellano, «A.H.D.E», 6 (1929), 260-328; Libro de los Fueros de Castilla. Barcelona, El Albir, 1981.

[20] Alfonso García Gallo, Aportación al Estudio de los Fueros, em “A.H.D.E”, 26 (Madrid, 1956), p. 387-446; Idem, Manual de Historia del Derecho español, vol. I, 6.ª ed., Madrid, 1975, p. 367 e ss.

[21] Luís G. de Valdeavellano, Curso de Historia de las Instituciones españolas. De los origenes al final de la Edade Media. Madrid, Alianza Editorial, 7.ª ed., 1984 (1.ª ed., 1968), especialmente p. 529 e ss.

[22] Luís G. de Valdeavellano, Orígenes de la Burguesía en la España Medieval, Madrid, Espasa-Calpe, 1975 (1.ª ed., 1969)..

[23] A. López Ferreiro, Fueros Municipales de Santiago y su tierra, 2 vol., Santiago, 1895 (fac-simile, Madrid, 1975).

[24] J. Villa-Amil y Castro, Los foros de Galicia, Madrid, 1884.

[25] E. Saez, Cartas de población del monasterio de Meira, «A.H.D.E», 14 (1942-1943), p. 501 e ss.

[26] Rafael Gibert, El Derecho Municipal de León y Castilla. «A.H.D.E», 31 (1961), p. 698-708. Note-se que, enquanto o foro de Compostela foi outorgado a Noya, Padrão e Pontevedra, na área meridional da Galiza impôs-se o foral de Allariz, derivado do de Sahagún, que se estenderia a Orense, Bonoburgo de Caldelas e Ribadávia. No espaço oriental foi maior a influência do foral de Leão, expressamente referido quando Afonso VII doou Villa Mayor ao bispo de Mondonhedo

[27] J. I. Ruiz de la Peña, Poblamientos y cartas pueblas de Alfonso X y Sancho IV en Galicia, em “Homage a don José Maria Lacarra de Miguel”, em Estudios Medievales, vol. 3, Zaragoza, 1977, p. 27-60; E. Portela Silva, La región del obispado de Tuy en los siglos XII a XV, Santiago, Universidade, 1976; F. López Alsina, Introduction al fenómeno urbano medieval gallego, a través de tres ejemplos: Mondoñedo, Vivero y Ribadeo, Santiago, 1976.

[28] E. Benito Ruano, Desarrolo urbano de Asturias en la Edad Media. Ciudades y “Pollas”, em “Boletim del Instituto de Estudios Asturianos”, XXIV (1970), p. 159-180.

[29] Juan Ignacio Ruiz de la Peña, Las “Polas” Asturianas en la Edad Media. Estudio y Diplomatario, Universidade de Oviedo, 1981.

[30] Gonzalo Martinez Diez, S.I., Alava Medieval, 2 vol., Vitória, 1974.

[31] J. M.ª Lacarra, Notas para la formación de familias de fueros navarros, em “A.H.D.E” X (1933), p. 249 e ss.; Idem, Para el estudio del municipio navarro medieval, em Principe de Viana II (Junho, 1941), p. 500 e ss.

[32] J. M.ª Lacarra, Documentos para el estudio de la reconquista y repoblación del Valle del Ebro, em “Estudios de Edad Media de la Corona de Aragon” (Zaragoza), vol. II (1946), p. 469-574, III (1949), p. 499-727, V (1952), p. 511-568.

[33] M. Graal, Cartas pueblas del reino de Valencia. Cit. por Font Rius, l. c., p. 46.

[34] Prospero de Bofarull, Colección de documentos inéditos del Archivo de la Corona de Aragón, tomos IV, 1849, VIII, 1851. Cit. por Jose Maria Font Rius, Cartas de Población y Franquicia de Cataluña, Vol. II, Madrid-Barcelona, Consejo Superior de Investigaciones Científicas, 1983, p. 51.

[35] José Maria Font Rius, Cartas de Población y Franquicia de Cataluña. Madrid‑Barcelona, Consejo Superior de Investigaciones Científicas, 1969 e 1983. Nas Jornadas sobre o Município na Península Ibérica realizadas em 1985, Salvador Claramunt Rodriguez apresentou uma perspectiva global das origens e da evolução do município catalão, que se declarou como tributária dos estudos de Font Rius (Origenes y Evolución General de Municipio Catalan, em Câmara Municipal de Santo Tirso, Actas das Jornadas sobre o Município na Península Ibérica (Séculos XII a XIX), Santo Tirso, 22 a 24 de Fevereiro, 1985, 2 vol., Santo Tirso, 1988, p. 169-192).

[36] Ana Maria Barrero García, Observaciones al Estudio de los Fueros, em El Fuero de Santander y su Epoca, Santander, 1989, p. 192.

[37] Ana Maria Barrero García e Maria Luz Alonso Martin, Textos de Derecho local español en la Edad Media. Catalogo de fueros y costumbres municipales, Madrid, C.S.I.C., Instituto de Ciencias Jurídicas, 1989.

[38] Embora a autora estenda o âmbito da sua obra a Portugal, é incompleta nesse aspecto, deficiência habitual em obras sobre o assunto publicadas no estrangeiro.

[39] Maria del Carmen-Carlé, Del Concejo Medieval Castellano-Leonés, Buenos Aires, Instituto de História de España, 1968.

[40] Pierre Bonnassie y otros, Estructuras feudales y feudalismo en el mundo mediterráneo, Barcelona, Editorial Crítica, 1984, p. 92-116: Reyna Pastor, Sobre la articulacón de las formaciones economico-socialess: comunidades de aldea y señorios en el norte de la Peninsula Iberica (siglos X-XIII).

[41] José Angel García de Cortázar e outros, Organización social del espacio en la España medieval. La Corona de Castilla en los siglos VIII a XV, Barcelona, 1985. A metodologia preconizada e exemplificada por García de Cortázar foi seguida com excelentes resultados, entre outros, por Santiago Aguade Nieto, no estudo da sociedade campesina das Astúrias (Santiago Aguade Nieto, De la sociedad arcaica a la sociedad campesina en la Asturias Medieval, Madrid, 1988), por Iñaki Martín Viso, que se debruçou sobre o povoamento e as estruturas sociais no norte da Península Ibérica, do século VI ao século XIII, analisando comparativamente, sob diversos aspectos, duas sub-regiões da sub-meseta norte: o alto vale do Ebro e o ocidente da actual província de Zamora (Iñaki Martín Viso, Poblamiento y Estructuras Sociales en el Norte de la Península Ibérica, Salamanca, 2000), e por diversos autores, em comunicações apresentadas em 1989, no Congresso Comemorativo do Foral de Santander, secretariado por García de Cortázar (Diputación Regional de Cantabria, Ayuntamento de Santander, Universidad de Cantabria, El Fuero de Santander y su epoca, Actas del Congreso Comemorativo de su VIII Centenário, Santander, 1989). Quando o nosso trabalho já estava praticamente concluído apareceu nos escaparates um interessante estudo dedicado por Sánchez Badiola ao território leonês: Juan José Sánchez Badiola, La Configuración de un sistema de poblamiento y organización del espacio: el territorio de León (siglos IX-XI), León, Universidad, 2002).

[42] Fundación Sánchez-Albornoz, Concejos y Ciudades en la Edad Media Hispanica – II Congreso de Estudios Medievales, Móstoles, 1990.

[43] Cf. especialmente, a p. 21, Magdalena Rodríguez Gil, Notas para una Teoria General de la Vertebración Juridica de los Concejos en la Alta Edad Media.

[44] III Jornadas Burgalesas de Historia, Burgos en la Plena Edad Media, Burgos, 1991.

[45] Ayuntamento de Logroño, Actas de la Reunión Científica “El Fuero de Logroño y su época”, Logroño, 1996.

[46] Fundación Sánchez-Albornoz, Despoblación y Colonización del Valle del Duero – Siglos VIII-XX, IV Congreso de Estudios Medievales, Avila, 1995. Merece realce a conferência inaugural, de J. A. García de Cortázar, sobre “Las Formas de Organización Social del espacio del Valle del Duero en la alta Edad Media: de la espontaneidad al control feudal”, a p. 11-44. Refira-se também a obra Del Cantabrico al Duero: trece estudios sobre organización social del espacio en los siglos VIII a XIII, organizada por José Angel García de Cortázar, com estudos de vários historiadores que dissecaram o tema, abordando uma pluralidade de situações: articulação territorial, espaços linguísticos, contributos da arqueologia, sociedades de fronteira, vales e aldeias, aldeia e solares, cidades e aldeias, organização paroquial e dioceses, alfozes e tenências, fortificações, organização social de territórios específicos (José Angel García de Cortázar et alii, Del Cantabrico al Duero: trece estudios sobre organización social del espacio en los siglos VIII a XIII, [Santander], Universidade de Cantabria / Parlamento de Cantabria, 1999).

[47] Para uma primeira perspectiva da historiografia dos municípios medievais, cf. Maria Helena Cruz Coelho, A História e a Historiografia Municipal Portuguesa, em O Município Português na História, na Cultura e no Desenvolvimento Regional (Actas do Colóquio realizado em 4 e 5 de Junho de 1998), Braga, Universidade do Minho – Instituto de Ciências Sociais, 1998, p. 37-77.

[48] Augustin Thierry, Dix ans d'études historiques. 4.e éd., Paris, Just Tessier, 1842; Idem, Lettres sur l'Histoire de France. 7.e éd., Paris, Just Tessier, 1842.

[49] Augustin Thierry, Essai sur l'histoire de la formation et des progrès du Tiers État, 2.e éd., Paris, Furne et C.ie, 1853.

[50] Podem ler-se no vol. V dos Opúsculos.

[51] A História de Portugal de Alexandre Herculano, que termina com o reinado de D. Afonso III, foi publicada em quatro volumes, em 1846, 1847, 1849 e 1853. Conheceu várias edições, a mais recente, com notas críticas de José Mattoso, publicada em 1983.

[52] Na Histoire de la Civilisation en Europe, publicada em 1828, Guizot diz que a história resulta da luta de três princípios: o “princípio da necessidade”, personificado no Papado, o “princípio democrático” representado pelas comunas, e o princípio da “liberdade”, introduzido pelos bárbaros. Por intermédio desses princípios, a divina Providência executa o seu plano relativo aos homens, sem que estes se apercebam da obra em que trabalham, como os operários que fabricam em separado as diversas peças de uma máquina, cujo projecto desconhecem. Cf. António José Saraiva, Herculano e o Liberalismo em Portugal, Lisboa, Livraria Bertrand, 1977, p. 51-52.

[53] O primeiro volume da História de Portugal foi publicado em 1846, o segundo em 1847, o terceiro em 1849 e o quarto em 1853.

[54] António José Saraiva, Herculano e o Liberalismo em Portrugal, Lisboa, Livraria Bertrand, 1977, p. 195-212.

[55] História de Portugal, IV, p. 120 (ed. de 1853).

[56] Alexandre Herculano, artigo em O Português, de 17 de Maio de 1853. Citado por A. J. Saraiva, l. c., p. 196-200.

[57] Alexandre Herculano, História de Portugal, IV, Lisboa, 1983, p. 148-149.

[58] Teófilo Braga, História do Direito Português. Os Forais, Coimbra, 1868. Para uma síntese das ideias de Teófilo Braga, cf. António Matos Reis, Origens dos Municípios Portugueses, 1.ª ed., Lisboa, 1991, p. 15-17 (2.ª ed., ibidem, 2002, p. 22-23).

[59] Tomás Muñoz y Romero, Sobre el origen de la población de los Reinos cristianos de la Peninsula en la Edad Media, el estado de las tierras, la condición social de las clases inferiores, la nobleza y las instituciones generales y locales, Madrid, 1860. Para Teófilo Braga, os forais portugueses eram “derivados exclusivamente do génio germânico, em reacção constante contra o código visigótico e contra o direito romano”. Em alternativa, propunha uma classificação que, no entanto, carece de fundamentação adequada e de clareza na distinção entre as várias tipologias propostas.

[60] Sobre a formação de Henrique da Gama Barros e a sua orientação historiográfica, cf. Armando Luís de Carvalho Homem, Gama Barros, historiador das Instituições Administrativas, em Actas das Jornadas sobre o Município na Península Ibérica (Séculos XII a XIX), Santo Tirso, 22 a 24 de Fevereiro, 1985, 2.º vol., Santo Tirso, 1988, p.193-211. Incluiu bibliografia sobre o tema.

[61] Henrique da Gama Barros, História da Administração Pública em Portugal, Tomo I, Lisboa, Imprensa Nacional, 1885; tomo II, Lisboa, Tipografia da Real Academia das Ciências, 1896. Aos municípios e matérias afins são especialmente dedicados o Título II do Livro I, a Secção IV do Capítulo II do Livro II, no I Tomo, e o capítulo IV do Livro III, no Tomo II.

[62] Idem, ibidem, tomo I,, cit., p. 50.

[63] Idem, ibidem, tomo I, p. 30.

[64] Idem, ibidem, tomo I, p. 31-32.

[65] Os trabalhos de Alberto Sampaio foram reunidos nos dois volumes de Estudos Históricos e Económicos, Porto, Livraria Chardron, 1923. O mais extenso e mais importante é As Villas do Norte de Portugal (página 3-254), seguindo-se-lhe As Póvoas Marítimas (p. 255-370). As Villas do Norte de Portugal teve uma segunda edição, apresentada por Maria José Trindade (Porto, Editorial Vega, 1979). Por naturalmente ser a mais acessível aos leitores, faremos as citações a partir desta edição.

[66] A origem e a formação das paróquias têm sido objecto de um crescente número de trabalhos de investigação, especialmente nos países do ocidente europeu. Citem-se, como exemplos mais recentes, Philipe Pergola (coord.) ed altri, Alle Origini della Parrochia Rurale (IV-VIII sec), Città del Vaticano, Pontificio Istituto di Archeologia Cristiana, 1999; Fernando López Alsina, Parroquias y diócesis: el obispado de Santiago de Compostela, em José Angel García de Cortázar y otros, Del Cantabrico al Duero. Trece Estudios sobre Organización del Espacio en los siglos VIII a XIII, Santander, Parlamento de Cantabria, 1999, p. 263-312; Christine Delaplace, Aux origines de la paroisse rurale en Gaule meridionale (IV-IX) siècles, Toulouse, Errance, 2005.

[67] Alberto Sampaio, l. c., p. 139.

[68] Alberto Sampaio, l. c., p. 142.

[69] Alberto Sampaio, l. c., p. 143.

[70] Torquato Brochado de Sousa Soares, Apontamentos para o Estudo das Instituições Municipais Portuguesas, Lisboa, s. e., 1931.

[71]Torquato de Sousa Soares, Política Administrativa: – As cartas de foral – Constitução de concelhos rurais e urbanos: as suas características essenciais, em História da Expansão Portuguesa no Mundo, dirigida por Dr. António Baião, Dr. Hernâni Cidade e Dr. Manuel Múrias, vol. I, Lisboa, 1937, p. 78-87; Idem, v. concelhos, em Dicionário de História de Portugal, dirigido por Joel Serrão, vol. I, 1ª ed., Lisboa, 1963, p. 651-654.

[72] Humberto Baquero Moreno verifica que na classificação apresentada pelo Prof. Torquato Soares sob a designação genérica de concelhos urbanos estão abrangidos seis grupos estudados por Herculano, a saber, os três últimos géneros de concelhos imperfeitos e os três únicos tipos de concelhos completos. Cf. Humberto Baquero Moreno, Os Municípios Portugueses nos séculos XIII a XIV, Estudos de História, Lisboa, 1986, p. 22.

[73] Manuel Paulo Merêa, Organização Social..., cit., p. 490-491.

[74] Manuel Paulo Merêa, Organização Social..., cit., p. 491.

[75] Alexandre Herculano, História de Portugal, Livro VIII, p. I.

[76] Paulo Merêa, Lições..., cit., p. 71-74.

[77] Paulo Merêa, Lições..., cit., p.76.

[78] Marcelo Caetano, A Administração Municipal de Lisboa durante a Primeira Dinastia, Lisboa, Empresa Nacional de Publicidade, 1951; As cortes de Leiria de 1254. Memória Comemorativa do VII Centenário. Lisboa, Academia Portuguesa de História, 1954; Subsídios para a História das Cortes Medievais Portuguesas, em ­Actas do Congresso Histórico de Portugal Medievo, ­«Bracara Augusta», XIV‑XV, (1963), p. 139‑160, e separata, Lisboa, 1963; Os Forais de Évora, Évora, Tip. G. Eborense, 1969.

[79] Marcelo Caetano, História do Direito Português (1140-1495), Lisboa, Editorial Verbo, 1981. Para os que entendem que seria nobilitante a ascendência romana do município medieval, será esclarecedora a síntese de Marcelo Caetano sobre as cidades romanas da província.

[80] Marcelo Caetano, História do Direito Português (1140-1495), Lisboa, Editorial Verbo, 1981, p. 221.

[81] José Mattoso, Identificação de um País. Ensaio sobre as origens de Portugal 1096‑1325. Vol. I - Oposição, vol. II - Composição, Lisboa, Editorial Estampa, 1985. Utilizamos a 5.ª ed., ibidem, 1995.

[82] José Mattoso, Fragmentos de uma composição medieval. Lisboa, Editorial Estampa, 1987.

[83] Por exemplo, enquanto para Borges Coelho a defesa dos direitos individuais e a organização associativa plasmada nos forais são uma conquista revolucionária, para Reyna Pastor a concessão dos forais resulta da derrota das liberdades comunitárias.

[84] António Borges Coelho, Comunas ou Concelhos, Lisboa, ed. Prelo, 1973.

[85] Reyna Pastor, Resistencias y luchas campesinas en la época del crescimiento e consolidación de la formación feudal. Castilla y Lérida, siglos X-XIII. Madrid, Siglo Veintiuno, 1980.

[86] José M.ª Font Rius, Cartas de Población y Franquicia de Cataluña. Madrid‑Barcelona, vol. II, Consejo Superior de Inv. Científicas, 1983.

[87] Ana Maria Barrero Garcia e M.ª Luz Alonso Martín, Textos de Derecho Local Español en la Edad Media. Catalogo de Fueros y Costums Municipales. Madrid, Consejo Superior de Investigaciones Científicas, 1989.

[88] James F. Powers, A Society Organized for War, Te Iberian Municipal Militias in the Central Middle Âges, 1000-1284. University of California, 1988.

[89] José Angel García de Cortázar y otros, Del Cantabrico al Duero. Trece Estudios sobre Organización del Espacio en los Siglos VIII a XIII. Santander, Parlamento de Cantabria, 1999, p. 15-48.

[90] Robert Durand, Les Campagnes Portugaises entre Douro et Tage aux XII.e et XIII.e siècles. Paris, F. K. G. – Centro Cultural Português, 1982.

[91] O elenco desses estudos pode consultar-se em Monique Bourin et Stéphane Boisselier (direction), L’Espace Rural au Moyen Âge – Portugal, Espagne, France (XIIe-XIVe siècle), Rennes, Presses Universitaires de France, 2002, p. 11.

[92] Robert Durand, Les Campagnes Portugaises entre Douro et Tage aux XII.e et XIII.e siècles. Paris, F. K. G. – Centro Cultural Português, 1982, p. IX-X.

[93] Robert Durand, Les Campagnes..., p. 131-168.

[94] Stéphane Boisselier, Naissance d’une Identité Portugaise, Lisboa, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1999.

[95] Monique Bourin et Stéphane Boisselier (direction), L’Espace Rural au Moyen Âge – Portugal, Espagne, France (XIIe-XIVe siècle), Rennes, Presses Universitaires de France, 2002.

[96] Câmara Municipal de Santo Tirso, Actas das Jornadas sobre o Município na Península Ibérica (Séculos XII a XIX), Santo Tirso, 22 a 24 de Fevereiro, 1985, 2 vol., Santo Tirso, 1988.

[97] Entre outros, Luís Miguel Duarte e Amélia Aguiar Andrade.

[98] No elenco bibliográfico, referem-se diversas obras destes autores.

in António Matos Reis - História dos Municípios, https://sites.google.com/site/historiadosmunicipios/historia-dos-municipios/capitulo-i---historiografia-dos-municipios-medievais, [Consulta em 13dez2017]