TERRAS DE PENAGOYÃ:

Apesar de nos tempos de hoje não ser uma realidade correspondente ao que era no passado, defendo a sua promoção e estudo. Porque a nossa história deve ser estudada, preservada e publicitada.
SE NÃO DEFENDERMOS O QUE É NOSSO, QUEM É QUE O DEFENDE?
"

Por Monteiro de Queiroz, 2018

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Eduardo José

1964?/1965?

Eduardo José Monteiro deQueiroz
Peso da Régua, 15.abril.1964
de Oliveira da Costa | Gonçalves Monteiro | Pinto Leite | Feliciano deQueiroz - Teixeira Pereira

2020

Pais & Avós
Maria de Lourdes Monteiro de Queiroz
Silvina de Oliveira & Manoel Monteiro
&
Alberto Feliciano de Queiroz
Maria de Jesus [Maria Virgínia] & José Feliciano de Queiroz

Irmãos

Carlos Alberto (n. Santa Marta - r. Ílhavo, Aveiro); 
Paulo Manoel (n. Peso da Régua - r. São Paulo, Brasil);
Francisco José (n. Luanda, Angola - r. Marselha, França).


n. nasceu em...
r. reside em...

A Pandemia
e o empacotamento de velhos

"Um velho, num mundo de sucesso, vale pouco. É uma canseira ter de pagar a um lar para ter um velho, pois num mundo de lufa-lufa um velho não dá lucro, apenas prejuízo. Num mundo dirigido pela implacável mão justiceira do mercado, o velho é uma mercadoria que nem sequer dá para o inventário.

As notícias já não são bem notícias, são uma espécie de roleta russa que nos vai revelando o número dos que não tiveram sorte. O mundo acorda e deita-se à espera de melhores dias que tardam. As pestes matam e corroem a alma aos que ficam.

Entretanto, nas águas negras do infortúnio, as televisões encontram o seu melhor mundo. Por ali passam todos os números da desgraça. Muitas vezes com rostos. Outros com os números que falam de óbitos e de mais casos, incluindo os que estão nos cuidados intensivos e até dos recuperados. Os donos dos microfones têm o poder de nos dizer o que eles nos querem dizer.

Mas também, diga-se em abono da verdade, que se não fosse a covid-19 os velhos não existiam. Estavam nos tempos correntes empacotados em lares (estranha palavra que quer dizer atualmente despensa, mas que na origem significava as divindades protetoras da família – ainda me lembro de na infância se referir a ir para Penates, outros deuses protetores da casa), à espera que num fim-de-semana um familiar à vez os fosse visitar. Um velho, num mundo de sucesso, vale pouco. É uma canseira ter de pagar a um lar para ter um velho, pois num mundo de lufa-lufa um velho não dá lucro, apenas prejuízo. Num mundo dirigido pela implacável mão justiceira do mercado, o velho é uma mercadoria que nem sequer dá para o inventário.

A covid veio mostrar que afinal o mercado tem de ser ajustado, pois os velhos afinal têm um valor que não é completamente residual, antes constituem um nicho de mercado.

Ao morrerem como tordos são notícia porque, apesar do frenesim da vida, as famílias ainda se lembram dos velhos empacotados ao pé de outros velhos que aguardam pacientemente que chegue o dia de alívio dos que os depositaram em casas de repouso. As televisões sabem quanto vale em termos mediáticos a morte dos velhos em tempos de covid.

Na verdade, a morte de um velho, em tempos normais, não é grande notícia, não passa do esperado.
O que pode estar a acontecer é que ainda não se tenha extinguido a memória do familiar encavalitado noutros velhos em casas de repouso. E a televisão vai dando conta da via-sacra dos velhos infetados a caminho de onde os queiram, pois nem sempre se consegue empacotar nas devidas condições um velho, e muito menos um velho com covid.

Nestas circunstâncias, é sempre algo de muito apetecível verificar como desempacotar velhos que já não podem continuar a repousar nos lares onde estavam a aguardar a visita do familiar, muitas vezes escolhido à sorte entre os tais familiares.

Os espectadores adoram ver estas coisas em direto, falta claro o cheiro a sujo, a urina, mas o velhinho ali está a passar um mau bocado porque, afinal, não repousava na casa do repouso; apodrecia.

A pandemia trouxe para a tona dos dias o quanto valem os velhos em termos mediáticos. O seu valor, que andava muito por baixo, subiu um pouco.

Se não fosse a cegueira do mundo, talvez os que não são velhos tivessem tempo para pensar que um dia chegará a casa do empacotamento. A pandemia confina, fecha, mas pode abrir os olhos. É certo que os olhos só veem o que querem, mas se olharem e virem no presente o futuro aprenderão muito. A cegueira é a arma dos donos do tempo frenético. Outro tempo virá. O que mais tem o tempo é tempo; os velhos, não."

(Domingos Lopes, in Público, 13/04/2020)
https://estatuadesal.com/2020/04/14/pandemia-e-o-empacotamento-de-velhos/ [15.abr.2020]
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico
Advogado

"Vou deixar este mundo
sem sentir pena dele."

"Voi părăsi această lume, fără să-mi fie milă de ea.
Viața nu are ce sa-mi mai ofere, am văzut totul, am experimentat totul.
Dar, mai ales, urăsc epoca actuală, imi provoacă greață!
Totul este fals, totul a fost înlocuit, nu mai există respect pentru cuvântul dat, acum, tot ce contează sunt banii si averea!
Știu că voi părăsi această lume, fără să-mi pară rău de ea!", por Alain Delon

"Vou deixar este mundo sem sentir pena dele.
A vida não tem mais nada pra me oferecer, já vi tudo, já experimentei tudo.
Mas acima de tudo, odeio a era atual, me dá nojo!
Tudo é falso, tudo foi substituído, não há respeito pela palavra dada, agora tudo o que importa é dinheiro e riqueza!
Eu sei que vou deixar este mundo sem sentir pena disso!", por Alain Delon

por Marius Hevezi [https://www.facebook.com/Marius.Hevezi], 2.abr.2020

photo: gettyimages

Senhora da Serra
Alto do Marão

"Saí de Braga às 4.02 da manhã, com destino ao alto do Marão, para presenciar a festa de Nossa Senhora da Serra, que ocorre sempre no segundo domingo de Julho depois do S. Pedro. Meus compadres do Porto, o João e a Ana, já me tinham falado desta romaria há uns anos, mas eu ainda não tivera a oportunidade de lá ir.

Aconteceu que no 23º aniversário da Casa de Trás-os-Montes estivemos a apresentar o Grande Cancioneiro do Douro, de Altino Cardoso, obra onde se refere esta romaria como ocasião para a demonstração de música e dança tradicionais, concretamente para ouvir as chulas de Gestaçô ou das terras limítrofes, agora tocadas com violino.

Fui eu e a Tininha, minha esposa. Chegámos lá às 5.12, quase sempre sem trânsito até à subida para o alto da Serra, mas depois com a grande surpresa de ver que já lá estava um mar de gente, um mar de tendas e de tendeiros. Estacionámos e fomos à capelinha, agasalhados, por ali acima, até às antenas. Estava ainda fechada. A resposta sobre o horário da missa foi de que ela seria às nove ou nove e meia, que agora o padre é novo e levanta-se mais tarde, com toda a ironia do frio e da noite neste aparte. Meus compadres tinham assistido à missa, em tempos, às seis da manhã e às sete estavam a comer frango no churrasco e a ver os grupos a actuar. As mudanças, como se vê, estão em curso. Fomos ao carro buscar uma manta, das duas que leváramos e toca a ir arranjar lugar para ver nascer o sol.

E vimos. E aquela subida rápida para a crista do horizonte mal aflorou na linha do mesmo fez soltar aplausos e festejos. O culto solar ali na plenitude e nós a assistirmos, a participarmos nele. Lembrei o meu professor Moisés Espírito Santo e a sua interpretação de vel para o sol, sendo este o Velho, e fiquei com as ideias arrumadas sobre este mistério em que me envolvia directamente. Já o malhão velho e a chula velha ganhavam outra interpretação.

E visto o nascimento, foi vê-lo crescer, experimentando empírica e gostosamente essa teoria secular de pensar que é o sol que vai girando sobre nós, que foi tudo quanto vimos o sol fazer, ali em poucos minutos de esplendor.

De novo até à zona da capela para encontrar um lugar de espera, sem vento, aconchegado, que permitisse dormir um pouco. Que era o que víamos fazer, posto que acordados e despertos e sem frio fossem muitos e novos, mas também os vimos como justos a ressonar debaixo do céu.

Assim passou o tempo, num crescer de gente à volta. Na capela, a Senhora tem tratamento de imagem e esta foi outra surpresa: então não é que lá fui encontrar a pajela da Senhora com o poema de António Correia de Oliveira «Louvada seja na terra» escrito recentemente no verso?, esse poema que musiquei para «Os Sinos da Sé», a que acrescentei até mais letra, e que faz parte do nosso disco «Queremos dar-Te graças». Que pena tenho de não saber postar aqui e agora essa música.

O encantamento do altar, na sua simplicidade e «tosca» decoração, deixa ao visitante e ao devoto uma experiência singular de acolhimento: ali se deixa a esmola, ali se depositam os cravos e ali se pagam os cravos ou as flores e logo se deixam ali, ali se conversa e se reza, ali se vai e chega com a postura de dever. Ali se anda de joelhos e a pé à volta da capela, pelo corredor, que se varre a espaços para evitar as areias, ali foi o grupo de bombos «Os Borgas» de Ovil, Queimada, Baião, ali foram os dois grupos folclóricos, o de Carneiro, Amarante, e o de Gestaçô, Baião. A missa foi campal. O padre era novo, o coro esforçou-se, as pessoas ajuntaram-se, o rito funcionou. Já o Sol queimava, já o corpo pedia o farnel e nós, de ouvidos cheios de chulas, verdegares, viras e malhões, fados e valsas, as mesmas quadras à Senhora em todas as peças, corpos suados e trajes de compostura variada, viemos dali felizes, com a ideia de termos ido a ganhar a plena consagração."

Por José Hermínio da Costa Machado, [12.jul.2009]
https://mineirodejales.blogspot.com/2009/07/senhora-da-serra-alto-do-marao.html [14.abr.2020]

Photo: https://www.geocaching.com/geocache/GCKQG3_antenas-do-marao [14.abr.2020]